sexta-feira, 3 de fevereiro de 2012

Cartas de Leningrado (II)

22 de outubro de 1941
Leningrado, CCCP

       

         Como vão as coisas, Volódia, meu filho? Faz muito tempo que não escreve a nós, não é mesmo? Sabemos que as coisas não estão sendo fáceis no Front, mas de vez em quando lembre-se de nós, sentimos saudades!
           
          As coisas aqui em Leningrado estão piorando... Os nazistas continuam a bombardear a cidade, mesmo não tendo mais nada para destruir... O frio está chegando, sentimos que esse Inverno será mais rigoroso do que nos outros anos.

          Hoje ficamos sabendo que definitivamente a nossa linha de abastecimento pelo Lago Lagoda foi completamente fechada; Os alemães estão nos impondo um  cerco medievo de extrema crueldade... Não há mais meios de trazer-se comida, afinal, sem a passagem pelo Lagoda, ficamos totalmente sós nessa luta.

         E para piorar, os finlandeses entraram nessa guerra maldita! Malditos! Pagarão por isso!

         As coisas na fábrica de tanques estão ficando mais pesadas, falta sazonalmente energia para produzirmos os nossos tanques... Não sabem eles que não há como soldar metal sem energia! Não, não culpemos eles, a culpa é dos alemães, eles vem atacando a nossa central de energia sem piedade.

         Malditos, se querem nos matar, pelos menos se dignem a nos enfrentar na cidade, ao invés de fazerem isso!

         Tivemos novamente outro racionamento de comida, agora, só temos uma fatia de pão para o dia inteiro... Pelo menos se tivesse um pouco de vodka! Mas nada, só temos isso para passar o dia.

          Para piorar, roubaram o cartão de refeição de sua irmã, eu sei, eu sei, isso é terrível! Como puderam fazer isso? Em todo caso, estamos dando de comer a ela com o pouco que temos. 

           As coisas não estão fáceis, meu filho, tanto para nós, como para você! Como vão as coisas em Moscou? Estão difíceis?

           Correm boatos de uma evasão aos Urais, isso procede?

           Eu espero que não, eu espero que não abandonem nossa querida capital, já basta Leningrado, Moscou não... O que essas bestas fariam se encontrassem Moscou desprotegida? Moscou é o coração da Mãe-Pátria! Moscou é alma do nosso povo! Se perdemos Moscou perdemos tudo!

           Sabemos que as coisas vão piorar daqui em diante, o frio já adoece as crianças, e faz tremer os velhos, não demorará muito para que as pessoas caíam duras no chão pelo frio ou pela fome. 

           Nas ruas, enquanto vemos cair a neve do céu, encontramos as pessoas mais magras, com semblantes mais cadavéricos, pálidos diante ao frio, envoltos em panos surrados, debatendo-se contra o tempo, enquanto arrastam trenós pela cidade.

           Não demorará muito para as pessoas trocarem as suas coisas por comida, na verdade, isso já está acontecendo... A polícia tenta reprimir esse comportamento, a especulação deve ser punida, mas tudo fica mais difícil quando se tem a fome!

           Saiba Volódia, mesmo que as coisas estejam ruins aqui em Leningrado, nos sempre vamos o amá-lo, mesmo estando distante de nós, pois sabemos que você irá lutar com tudo que puder para extirpar esses crápulas insensíveis.

            Me despeço de você, meu Vladimir Vassilevich, meu querido filho, com um aperto no coração, pois talvez essa seja uma das últimas cartas que chegarão a você. Desejo-lhe saúde e muita felicidade. Cuide-se e seja feliz.

                                                                                                Cordialmente seu pai,  Vassili Efremenvich

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