quarta-feira, 31 de agosto de 2011

A caneta nanquim (texto do blogueiro)




Numa paisagem bucólica, um tanto silenciosa, numa das numerosas ruas da capital, caminhava um apressado jovem com um horário extremamente corroído.
Não notara com afeição alguma aquela paisagem;  não prestara atenção nas árvores retorcidas, os ipês amarelos, os eucaliptos transplantados e os cedros de pequeno porte, ao passar pela pequena pracinha dali.
Voltara de uma extenuante e entediante aula na universidade e totalmente exausto com a fala tediosa de sua professora cadavérica e rigorosamente irritante, só tencionava descansar como qualquer pessoa normal.
Trabalhara a noite anterior inteira num projeto para a universidade que até se esquecera que tinha dormir certa altura.
Sabia que não gostava de acordar tão cedo para seguir a uma aula tediosa. Sonolento, mas apressado, pegara duas conduções em direção ao pequeno sobrado em que morava naquele bairro bucolicamente tranquilo no centro da Capital.
Nem parecia estar na capital. Aquele era sem dúvida um dos lugares mais tranqüilos dali, em sua quadra, o ultimo crime que se tem notícia já passa mais de oito meses! Ali, não havia muitas algazarras durante a noite, uma ou outra festa no final de semana. Parecia uma cidade do campo de tão tranquila, mas nem por isso era isolada aquela localidade,  ficava a duas quadras do shopping e meia do centro comercial mais próximo; tinha uma padaria, dois mercados, dois bares, quatro barbeiros, uma pizzaria, uma casa de finanças, uma verduraria, uma academia, um curso de línguas e até uma funerária, não precisava nem sair dali.
Contudo, a vida daquele rapaz era totalmente voltada ao seu estudo na Universidade e no centro da Capital, não muito longe dali, mas mesmo assim, passava pouco tempo em casa.
Por sinal, tocando na conversa da casa, sua casa era um tanto exótica, no térreo, tinha uma grossa cobertura de cerâmicas brancas nas paredes exteriores, com as grades e janelas verdes, enquanto no pavimento do casarão, uma parede texturizada em um grafiato verde-paraiso coloria o repertório com telhas amarelo-pardo. Era sem dúvida uma prova de mau gosto de arquitetura.
Ele nem se importara com isso, passara só alguns minutos descansando em casa e logo correu em direção à barbearia local, onde cortaria seu cabelo e bateria papo com seu velho e tão bem conhecido barbeiro.
 Não foi o que aconteceu, tanto o barbeiro quanto o jovem ficaram calados. As conversas saudosas de política e futebol que os dois travavam com alegria, sequer passaram pela língua. Fora uma fria e curta sessão no barbeiro. O jovem sentiu-se estranho com isso.
Vestiu seu querido chapéu panamá amarelo e despediu-se secamente de seu barbeiro, após pagar-lhe uma quantia considerável pelo corte.
Cruzando a pequena praça, caminhou dentre as mesas de xadrez ali posta, onde os velhos desocupados daquele lugar se reuniam ao final de semana para bater papo e jogar dominó. Ele sequer tivera tempo de desfrutar da beleza que aquela praça proporcionava a todos os moradores; não prestava atenção na quadra poliesportiva dali, tampouco nas orquídeas e as margaridas exalantes nos numerosos jardins dali.
O jovem rapaz era pouco conhecido por ali (só mesmo de vista), mesmo morando ali há quase cinco anos, era ainda uma pessoa fechada, silenciosa, mas era um trabalhador dedicado, tão dedicado que raramente ficava em casa ou saía para festejar.
Ao cantar dos passarinhos, o jovem caminhou dentre o piso ladrilhado naquela tarde ensolarada da estiagem dos meses de agosto-setembro. Sua surdez parcial, em um ouvido, talvez um problema congênito, associada a sua pressa, o impediram de apreciar aquela beleza da situação.
O jovem rapaz, escritor nas horas vagas, e historiador nas horas corridas; tinha manias a si. Só conseguia escrever uma só palavra se fosse com sua amada e preferida caneta nanquim preta de 0.3 milímetros, caso o contrário não redigia sequer anotações importantes.
Caminhando na rua, sob o sol alaranjado do meio-dia, passou em frente às vendas locais, até encontrar-se de frente à última loja daquele conjunto comercial, lá era a papelaria.
Era um lugar vazio, isolado, ninguém sequer lembrava que ela existia, nem mesmo posso dizer que estava às moscas, pois nem mesmo moscas passavam ali.  Lugar tristonho aquele, sem nenhum cliente ávido por algo, com as prateleiras repletas de canetas e lápis, sob a ação da poeira corroídas, aquilo dera uma sensação de solidão ao exausto estudante.
Via ao fundo uma jovem moça arrumar uma papelada sobre a bancada, de costas para a entrada da papelaria e fracamente disse:
— Bom dia!
Ela não escutou, e ele não tencionava falar mais nada, apenas via a doçura laborante em sua frente. Verdade seja dita, o jovem sequer trabalhara uma única vez na vida, mesmo não tendo idade para tanto, não tencionava trabalhar tão cedo, mas não planejava ser sustentado pelo seu bem sucedido pai empresário.
Observava de longe o reluzente cabelo negro daquela inocente moça que estava apenas interessada em seguir o seu trabalho e com delicadeza a olhou sob uma ótica incomum. Ele não sabia quem ela era, mas sabia que algo nela o atraía.
O gritar vulgar de uma velha gorduchona, baixinha de nascença, que arrastava a mochila de sua filha para um apartamento  naquele edifício interrompeu por vez o silêncio estabelecido.
— Anda logo, menina! Você tem que fazer a lição de casa!
Virou-se o rapaz em direção a voz e após perceber que não era nada, retomou a olhar a moça, mas naquela altura, ela já percebera sua presença.
Ele era tímido, muito tímido, quando a viu caminhar para perto de si, quase não conseguiu pronunciar as palavras que viera a pensar. Sentia-se patético e então quando ela aproximou, disse com voz fraca:
— Você tem uma caneta nanquim?
— Nanquim?
A moça era baixa, não baixa para uma garota, mas baixa em relação ao estudante, tinha olhos penetrantes, de azul vivido intenso, cabelos lisos e negros como a noite, seu rosto era tremendamente lindo: sua boca era fina e sensual, seu nariz era fino e estreito.
Ela adentrou-se dentre as fileiras expostas defronte ao galpão e procurou com empenho a pequena caneta nanquim. Mas então ela entreolhou o solitário indivíduo com um olhar tristonho:
— Não, eu acho que não tenho essa caneta, moço. Eu tenho a tinta nanquim.
Aquele olhar deixou taciturno por um momento o estudante, que sentiu-se coagido a comprar a tinta nanquim, sem mesmo saber para quê servia.
— Pode ser.  Deixe-me ver a tinta.
A tinta era um tubinho pequeno, de plástico, de bico fino, uma coisa pequena e não muito cara. O valor era irrisório para o garoto.
“O que uma beleza como essa faz num lugar como esse? Eu realmente não entendo, ela poderia conseguir definitivamente uma coisa melhor. Mais que bela ela é. Que beleza a dela! Esse olhar, esse rosto, esse carisma... Meu Deus! Como eu queria... Como desejo... Eu... eu. Deus, tenho que controlar meus desejos!”
Já imaginava ele, com um emprego respeitável, assumindo os negócios de seu velho pai, e ela ao seu lado, ajudando nas finanças. Imaginava ele, passear à luz do luar, às margens do lago enquanto recitava sonetos românticos e acariciava-lhe o rosto. Se imaginava ele, deitado no colo daquela impressionante donzela, observando as nuvens, em cima de um gramado, ao tocar de violinos estridentes, num dos inúmeros parques da cidade.
Sabia ele que nada disso poderia ser possível, ela era visivelmente mais velha (tinha por volta de vinte a vinte e três anos) e ele só dezessete, mas não custava sonhar.
— Tenho esses modelos.
— Não, eu gostei desse aqui mesmo.
— Vai ser dessa cor?
— Você teria a cor preta?
Ela pegou a tinta de minhas mãos e retirou um mostruário daquela tinta na cor preta. A observava discretamente enquanto caminhava para o balcão.
— Um real e noventa centavos.
  Entregou-lhe uma nota de dois.
— É que eu estava era procurando uma caneta para desenho, você não teria essa mesmo? — Sentiu-se terrivelmente idiota ao falar isso.
— Como é essa caneta? É a primeira vez que ouço falar dela. Para quê serve?
— Ela é uma caneta de desenho, que eles usam para fazer mangás, no meu caso, uso para escrever.
— Ah! Tá. Aqui seu troco. Só isso?
— Sim. Obrigado.
— Obrigado a você.
O idiota sequer tivera a coragem de lançar um gracejo, uma cantada, ou mesmo um convite. Fazia quase um ano que não via sua querida e adorada donzela, a qual tanto amou, mas que o tanto rejeitou. Sentia uma tremenda dor no coração, ao sentir  que um dia acabaria sozinho, sem ter nada, nem ninguém. Baixou sua cabeça e percebeu de que nada valiam suas roupas da moda, a riqueza de sua família, seu “trabalho” na faculdade, sem ter a menos conquistado isso: um amor.
Observou o frasco de tinta e o enfiou de volta na sacola, caminhando pelo sol escaldante observou os outros nada fazerem, no seio do seu ócio do inicio de tarde. Caminhou pela rua, pensando no quão bom seria ser amado por aquela mulher, que trabalhava naquela pequena papelaria e que não sabia o que era uma caneta nanquim.
No fundo, ele sabia que nada disso aconteceria. Esbravejou algumas palavras em russo (sua língua preferida dentre as que sabia falar) e prometeu a si mesmo nunca mais se prender a uma única mulher. Nenhuma.
À noite, logo depois de voltar à universidade, deitou sua cabeça no travesseiro e cochichou para si: “ Ah, minha querida I. (inicial do nome), porque você não me amou? Por que, I.? Será que não sou bom o suficiente para você? Será que... " Levantou-se e correu em direção ao banheiro da suíte, onde se olhou no espelho.
Viu ali uma figura magricela, pálida, de cabelos cortados, olhos estreitos, nariz pequeno e largo (embora tivesse antepassados judeus), orelhas de abano e um queixo pontiagudo. Olhou para si, encarou-se com ódio e bateu levemente a cabeça no vidro do banheiro, sem quebrá-lo. “Meu Deus! Que coisa horrível eu sou! Essa coisa que tenta todo dia levantar-se da cama para seguir em frente, tentando por fim ser amado, mas no final é tão vazia e crua como o frio gélido do Espaço”
“Devo deixar de procurar outra pessoa, meu destino é ser só e só ficarei”
Voltou para cama e emergiu-se no sonho (sonhava sempre ser um bastião da liberdade, um líder das massas, mas nunca conseguia ser mais do que isso), no dia seguinte, logo de manhã, ele voltou para a papelaria de novo (sua mente fraca!).


PS: O jovem aqui representado, não é mais ninguém menos do que o próprio escritor, essa é uma história verídica e isso realmente aconteceu.

terça-feira, 30 de agosto de 2011

O soldado polonês (texto do blogueiro)

O lutar da guerra trazia grandes emoções àquele soldado, já tão distante de casa. Sabia que havia muito tempo que havia partido de sua aldeia nos arredores da cidadezinha de Lvov, onde seus pais cresceram, assim como seus avós, no meio de uma vida modesta, sem grandes luxos, numa fazenda de interior.
Aquele rapaz sabia até hoje como ordenhar uma vaca ( de cima para baixo, com força e delicadeza ao mesmo tempo), sabia como selar um cavalo e cavalgar ao longo do pequeno riacho da sua vila, onde admirava impaciente o por do sol, à sombra de uma macieira.
Vocês acham que ele se esqueceu de seu velho pai, já tão envelhecido e cego de um olho? É óbvio que não, ele pensava em seu velho pai todos os dias, pensava no tanto que aquela pequinesa pensava calada enquanto carregava com o ancinho pacotes e mais pacotes de feno rumo ao celeiro daquela pequena propriedade.
E de sua mãe, vocês acham que aquele pobre rapaz, com a cruz no peito e São Francisco de Pádua na alma, iria esquecer-se de sua velha mãezinha, toda enrugada, já corcunda, cheia de verrugas no rosto, que há tanto falecera em seu leito materno. Óbvio que não, o jovem garoto rezava todo dia para que sua mãe estivesse em paz no santo sepulcro celestial, em que os dois, inocentemente acreditavam.
Ah! E a jovem Marzella? A jovem donzela dos longos e finos cabelos escuros, olhos azuis, pele palidamente branca, boca sensual e traçado sinuoso. Acha que ele se esquecera de que estava a ponto de casar-se com ela e ter uma família?
É óbvio que não, ele não se esquecera que com ela queria ter filhos, com ela queria enamorar-se, com ela queria passar o resto dos seus dias caminhando ao luar, com o tocar de violinos estridentes, no exalar das flores noturnas, no parque de sua terra natal.
Esse era Wladyslaw Leśmian, o jovem soldado que saíra da sua confortável e bucólica aldeia em direção às baluartes de aço ali,naquela fétida trincheira, eslamaçada pela chuva do outro dia, corroído pela coqueluche e pelo frio, unicamente para defender a liberdade de sua obscurecida pátria. A velha e saudosa Polônia.
E pensar que ele poderia estar em Varsóvia estudando piano, podia estar estudando Direito em Crácovia, podia viajar até o mundo inteiro com o dote que receberia do pai de sua noiva (um rico comerciante russo, que na verdade era contrabandista de vodca), tudo isso ele podia, mas o calor da pátria era forte. Aquele garoto criado ao som da Polonaise, ensinado a se ajoelhar unicamente na presença de Deus, não aceitaria ver-se prostrar enquanto outros choravam a dor de ser polonês.
“Ser polonês é difícil. Ao mesmo tempo em que se deseja liberdade, pouco se faz para tê-la.” Pensava o jovem que se lembrava saudosamente do seu velho pai contando a história do levante de 1863, em que seu tio foi fuzilado a mando do Czar.
“Papai! Meu velho papa, precisava tanto vê-lo de novo, meu velho.”
Sabia que não veria seu pai tão cedo, nem mesmo sua noiva, mas pensava como seria aquele momento, o passear em meio ao vento esvoaçante com aquela beldade de lenço florido na cabeça em meio aos campos dourados de trigo que ele mesmo plantara, arara e iria colher. Pensava com felicidade, sobre a luz do pôr-do-sol, o momento em que poderia beijar sua amada sem se preocupar com nada.
“Ah!”
O tocar  estridente de um apito de marinheiro indicava que se devia entrar em formação. O jovem polaco vestiu seu capacete de aço, abotoou sua túnica e embainhou seu rifle.
—  Oчень хорошо! Levantem-se, seus porcos! Hoje é o dia de provarem sua coragem, hoje é o dia de se mostrarem dignos ao nosso Czar. Veremos se dentre vós distinguem os homens dos ratos! Em formação! — Gritou o capitão.
Nem se importara com os insultos do capitão, aquele oficial graduado que ganhara uma ordem dos Cavaleiros da Cruz de São Jorge logo naqueles dias, apenas pensava em sua Marzella.
— Boa sorte, camarada, não diga que não avisei — Falou o colega de Wladislaw, Grigori Chernenko.
Ele nem se importara com o apelo político de seu amigo para não ir naquela incursão, só pensava que logo estaria em casa, bebendo wodka( vodka) com seu pai e beijando sua Marzella. Veria seus amigos de infância, seus tios, todos obesos e brincalhões, veria todos esses.
— Ypa!
Os soldados levantaram-se daquela vala no meio do nada, apoiando-se em toras de madeiras infestadas com cupins e lama e seguiam sob um descampado em direção a um lugar não visível.
Sabiam, aqueles sensatos, que muitos morreriam, sabiam que poderiam ser feridos, mas com o Capitão apontando uma arma para quem recusasse e voltasse, tudo mudava.
Os alemães não estavam longe — eles com certeza fariam tocar suas metralhadoras irritantes e lançariam seus “espremedores de batata”. Mesmo assim, aqueles soldados rasos gritavam: “URA!” como se fosse a ultima coisa que iriam dizer.
Seria fatídico aquele dia 23 de agosto de 1914, mas faria de tudo para libertar sua amada Polônia da opressão prussiana e mais ainda para libertá-la da opressão do Czar. Wladyslaw lembrava de como seu irmão, Henryk, fora tirado do conforto do seu lar, sob o choro de seus filhos, unicamente por ter dito em público que não gostava do Czar.
“URA!”
À passo de ganso, marcham aquela centena de soldados, todos enfileirados, descarregando seus rifles Mosin Nagant sobre alvos desconhecidos e pensando sobre qual propósito estariam todos ali. Ninguém sabia de certo, nenhum ali era tão tolo de ser voluntário naquela sangrenta guerra, exceto Wladyslaw.
“Wladyslaw, Wladyslaw, que burrice você fez!”
O cricrilar das metralhadoras fez com que muitos caíssem de joelhos diante daquele inimigo poderoso, mas não Wladyslaw, Wladyslaw era forte, e não seriam meras balas traçantes de 7.62mm que o fariam ficar longe de sua querida Marzella.
Com a última bala do seu rifle já envelhecido, Wladyslaw conseguira perfurar o capacete de aço, pontudo, de um oficial alemão, mas aquilo teria um preço. Bum!
Um expansão gasosa fez com que aquela explosão ecoasse em toda aquela fileira de soldados e no meio da cratera formada, em meio ao pó e a sujeira, lá estava o estúpido polonês que apenas queria salvar sua terra, mas não se lembrava se estava vivo ou morto, se estava feliz ou triste, se estava com Marzella ou com uma anja para levá-lo ao Paraíso.
“Eu avisei”
Ao acordar no hospital de campanha, Wladyslaw mal conseguia respirar de tanta atadura que colocaram em si. Não podia mover-se e falar também não. Uma bondosa enfermeira, uma santa senhorita de alta classe, diga-se de passagem, trazia todo o dia o almoço e um noticiário, mas Wladyslaw ainda não sabia como foi parar ali.
— Enfermeira, quando poderei voltar para casa?
— Receio que em breve?
— Em breve? A guerra acabou.
— Para você acabou.
Foi aí que ele percebeu que estava sem as duas pernas e quando percebeu que não era um sonho (afinal, ele ainda sentia as pernas), gritou de agonia.
Assim ele voltou para a sua amada terra natal, longe de tudo aquilo, sem muito que fazer, ficou esperando na estação da cidadezinha, seu pai vir buscá-lo.
Andando com os punhos, aquele jovem soldado era motivo de chacota dentre os passantes da estação, de crianças a velhinhos, todos troçavam dele, pois parecia um mico de circo.
— Por que riem? Eu lutei no front, tive a coragem que muitos de você não têm. Se estou assim foi para deixar nossa pátria livre, a nossa amada Polônia!
Um assombro surgiu na plataforma, todos se calaram, agora sentiam vergonha de si, aquele jovem soldado agora inspirava um misto de respeito e pena nos que estavam ali. Todos calaram-se, até que uma garotinha sardenta caminhou em direção ao jovem soldado.
— Toma, moço, pode ficar com o dinheiro do meu lanche, precisa mais do que eu.
Wladyslaw não sentiu-se com forças para recusar àquela pequinesa essa demonstração de afeto infantil. Ele sentiu-se mal por ter recebido aquele dinheiro, mas mais mal ainda quando viu que os outros viajantes também se apiedaram dele e começaram a dar-lhe esmolas.
Wladyslaw sentiu-se humilhado.
Na estação, o agora portador de necessidades especiais encontrou-se com seus vizinhos de porteira, seus amigos e sua namorada, todos não o reconheceram.
—Veja só, o circo voltou a cidade — Troçou-lhe  Samuel Siewerski, seu melhor amigo, desde a infância.
Uma lágrima percorreu-lhe os olhos de profunda dor naquela situação, mais ainda quando viu a sua querida Marzella abraçada com outro rapaz que nunca vira na vida.
Wladyslaw desceu do banquinho em que havia se sentado e caminhando através dos punhos, sai da estação de trem. O grupo não resistiu e começaram a troçar dele, gesticulando como macacos.
Wladyslaw, já muito tristonho, vira-se em direção e Samuel e de baixo para cima diz:
— Eu esperava mais de você, Samuel. Eu realmente esperava mais de você — Chorou.
— Wladyslaw!?
Os amigos se envergonharam com tudo aquilo, Marzella mais ainda por ter trago seu novo namorado para àquela situação.
— Vem só vocês, saio para lutar pela nossa querida e amada terra e quando volto, o que encontro? Meus amigos troçando de mim e minha noiva abraçada a outro homem. Onde está meu pai?
— Wladyslaw — Tomou a palavra o seu vizinho de porteira, Bosleław Wolski — Seu pai está morto. Ele morreu duas semanas depois que você partiu.
Wladyslaw soltou um grito surdo e caiu em lágrimas tão tristonhas que fizeram até os passantes chorarem com sua dor.
— Wladyslaw...
— Deixem-me! Eu só preciso ir à igreja.
— Certo, mas deixe-me levá-lo pelo menos — Pediu Samuel.
— Em minhas condições, não há como eu recusar.
Os cinco saíram em comboio em direção à saída da estação ferroviária, sentindo muito remorso, os amigos de Wladyslaw pediam para os passantes para não rirem e nem apontarem para o soldado desarmado, e Samuel pediu um cocheiro os levasse para a pequena igreja de São Cristovão, nos arredores da vila.
Ninguém tivera coragem de emitir um som, ninguém tivera coragem de emitir uma só palavra, todos pensavam que o melhor seria ficar calado.
— Bem, vocês, quando estou aqui, vocês são falantes, quando parto e vou embora, ninguém sequer se pronunciou a dizer que meu pai morrera. Quando volto, falam-me coisas ruins, quando me revelo, falam nada.
Ninguém teve a coragem de respondê-lo.
Não ficava longe a igrejinha e em cinco minutos, lá estavam os cinco nas escadas da casa de Deus.
Wladyslaw caminha vagarosamente dentre os degraus e defronta-se com uma gigantesca estátua de Jesus Cristo, o velho profeta da Judéia que tanto ouvira das palavras do padre, e a ele olhou.
Os dois se entendem em amargurante dor, sabem a dor da sangria, cada um a seu modo, mas ambos estão aleijados, e ambos estão muito magros e fracos. Ali, defronte do ícone de madeira, Wladyslaw joga 70 zlotys ao pé da escultura, dinheiro esse que conseguira com as esmolas, e em seguida reza em latim e faz o sinal da cruz.
— Wladyslaw! Wladyslaw!
Wladyslaw caiu de queixo na pedra lapidada do chão límpido da entrada da igreja e dali não mais levantou, o jovem soldado enfim descobrira que tudo que pedira antes, de nada adiantou em razão de ter se aventurado em outras coisas, agora depois de maduro, quando pedira para morrer, seu pedido fora atendido. Não acredito nesse messianismo xamânico a que chamam de cristianismo, mas essa é a verdade dos fatos tais como são narrados.

domingo, 28 de agosto de 2011

Filmes para guardar no peito e na alma




Eis aqui uma lista dos filmes que marcaram a minha infância, minha adolescência e marcam agora o início da vida adulta.
Não está em ordem de importância!


Cidadão Kane
"I am Charles Foster Kane!"

Essa é a história mostra a trajetória de vida de um gigante (fictício) do ramo da Imprensa Americana, que era um sonhador de início, mas acaba se corrompendo e tendo um final... Ah! descubra o final, aê!

Com a direção especial de Orson Welles, produzido por Orson Welles, narrado por Orson Welles, atuado por Orson Welles. (o que mais esse cara não fez?) O mesmo Orson Welles que narrou o primeiro A Guerra dos Mundos.

Não é a toa que Cidadão Kane é apresentado como marco do Cinema Americano e Internacional.


O Encouraçado Potemkin
O Encouraçado Potemkin!

Eu já tive a oportunidade de fazer uma postagem desse filme que avalio como um dos melhores de todos os tempos, o Encouraçado Potemkin é um marco da história mundial, por mostrar o modo como o cinema pode ser politicamente engajado e ainda assim criativo. A cena da escadaria de Odessa, tão repetida nos Intocáveis, mostra o quão é poderosa essa produção do cineasta soviético Sergei Eisenstein.

Corre cambada!
 O Grande Ditador


O mundo que se cuide!



Incomparavelmente essa sátira bem humorada do universo fascista em que se inseria a Europa mostra o quanto devemos lutar pela liberdade e contra a tirania. O Grande Ditador sem dúvida é um dos melhores filmes de Charles Chaplin, não só por ser o primeiro a ser inteiramente falado, não só pelos seus toques humorísticos especiais, mas por ser politicamente engajado e de proposta pacifista (reflexo da reunião que Chaplin tivera com Gandhi alguns anos antes). O Grande Ditador mostra que o riso também pode se tornar uma arma contra a opressão demasiada.


Tempos Modernos
O operário Carlitos!

Já que estamos falando de Chaplin mesmo, colocaremos o Tempos Modernos na lista, pois ele mostra como o indivíduo tem que lutar para se manter indivíduo numa sociedade industrializada e mecanizada como a atual. Tempos Modernos, assim como o Grande Ditador, tenta lutar para mostrar os vestígios da nossa humanidade que anda tão escondida nesses tempos. 

Coloca-se aí também todos os filmes de Chaplin

  Se eu for enumerar todos, não haverá espaço para os outros os filmes. Mas com certeza, o Luzes da Ribalta realmente me emociona de jeito (toda a vez que eu o vejo, acabo chorando, não sei como).


O Circo, A corrida do Ouro e Luzes da Cidade, me lembram como o humor bobo e desprovido de palavrões pode ainda ser risível com sua simplicidade estonteante.



O Poderoso Chefão

Não brinque com os sicilianos!

O Poderoso Chefão é o filme que mais apresenta a psicologia masculina implícita. Mostra de uma só tacada, o valor da família, o código masculino (siciliano), os efeitos de uma traição, e que tudo no final são negócios. Os três filmes sem dúvida impactam profundamente qualquer amante de cinema, nessa produção de Francis Coppola, com Marlon Brando, Robert De Niro, Al Pacino e Robert Duvall, que mostra perfeitamente o início, o meio e o fim das atividades da Máfia nos EUA. Ganhando inclusive o Oscar de melhor adaptação de roteiro escrito.
 
A série Indiana Jones
"Dad, don't call me of Junior!"

Simplesmente a melhor série de Aventura da história do cinema. Com o seu chapéu fedora marrom na cabeça, jaquetão de couro  e o chicote nas mãos, Indiana Jones sem dúvida é o melhor aventureiro retratado nas películas. Um herói sem capa ou sunga por cima da calça, o Indiana Jones também tem suas fraquezas como qualquer ser humano normal, lutando contra as hordas fascistas em nome da História.

Star Wars e Star Trek
O Senhor Spock, a Princesa Leia e o Capitão Kirk

Embora pareçam ser rivais no exterior, essas duas franquias de ficção científica conseguem ainda me cativar como amante do cinema. Luc Skywalker lutando contra o Darth Vader em prol das forças do bem sem no final saber que era na verdade filho do Darth Vader (spoiler!) e ainda o Capitão Kirk lutando Espaço afora contra inimigos intergaláticos ou promovendo a paz para a Federação enquanto contata outras civilizações, tudo isso me mostra o como a Ficção Científica pode ser cativante. 
O quê? O capitão Kirk beijando a Princesa Leia? E o Han Solo? Isso vai dar merda!
 
O Capitão Kirk versus Darth Vader. Eu disse que ia dar merda!

A nova série de filmes do Batman


Agora parece um macho de verdade!

Porque eu inclui a série do Batman nessa história? Porque foi a primeira vez que o Batman, em toda a história do Batman, não foi retratado como um playboyzinho viado de Gotham City. Afinal foi ele que tava dando uns pegas na mina do Tom Cruise.
Esse Coringa fez com que as criancinhas se borrassem de medo ao ver palhaços!

E o Coringa? Vocês podiam ter suas dúvidas quanto ao carinha que fez Brokemontain alguma coisa, mas foi ele que fez o coringa ficar foda daquele jeito.

O Pianista; A Lista de Schindler; A vida é bela.



Esses três filmes até hoje me mostram o modo como a humanidade chegou ao ponto de pura selvageria. Eles são para me mostrar que nem tudo são rosas e que devemos pensar também em outras coisas.


Circulo de Fogo
Vai brincar com o Zaytsev pra você ver.

A história do jovem pastor dos Urais, Vassili Zaytsev, que tem que enfrentar no meio dos escombros toda a máquina de guerra nazistas. Esse sem dúvida é melhor filme ocidental para mostrar o terror dos dias negros em Stalingrado. Não foi a toa que foi parcialmente copiado no mundo dos videogames, no Call of Duty 5.



Cinema Paradiso
 
A única vez em que vi esse filme, eu ainda era criança, mas eu lembro até hoje a história do operador de projetor de cinema, mostrando a um pequeno garoto o amor pelo o cinema. Lembro até hoje com tristeza como aquele velhinho ficou cego.

A queda, as últimas horas de Hitler.

SE FUDEU!!!!!Toma bigoduda!

Pode parecer até absurdo, mas não há um só momento naquele filme inteiro que eu não ria da desgraça do Hitler ali retratado, o modo como ele perdia o poder, o modo como a alta cúpula fascista desmoronava em bebidas, orgias e outras coisas mais. Foi um dos primeiros filmes ocidentais que tenta mostrar que a guerra foi vencida pelo Exército Vermelho e não pelos EUA.


Quando Nietzsche chorou.
 
Esse filme mostra de modo ficcional um suposto entre o velho Friedrich e o professor do ascendente Sigmund Freud, mostrando de modo impactante a vida de ambos e levando a uma análise fillosófica sobre tudo isso.


Stálin


Embora seja um filme da HBO com muitos cunhos burgueses em seus principios, ainda assim é uma boa interpretação da saga de vida do líder sovíetico, mostrando a doença de Lênin, a rixa entre Trotsky e Stálin, e os mandos e desmando de Stálin. Com Robert Duvall no papel de Stálin.



O transformador da realidade

Hoje nós somos bombardeados com um número assustadoramente gigantesco de fotografias ditas suspeitas.  Aka Playboy Orkut (Orkut is dead).

Você acreditaria que aquela gostosa, parecendo uma Megan Foxx ou uma Katy Pery da vida, com aquela pose hipersensual, debruçada numa cadeira de praia na verdade não fosse nada próximo disso: Uma mulher meio balofa, do cabelo ruim, totalmente enrugada, com pelancas nas pernas e cara de doninha.
Para você distorcer a realidade, você não precisa mais beber, o Photoshop já faz isso por você!

It's a fake, Dimitri!

Em todo o caso, quem poderia ter feito tamanha falta de sacanagem? Eu digo quem, o grande pai Photoshop.

Adobe Photoshop, o Deus dos cirurgiões-plásticos!

Você realmente acha que essa onda de retocar fotos é de agora? Óbvio que não.

Parece que afinal o Photoshop 1.0, lançado em 1990, ocupando o espaço de um disquete (1,44Mb) não foi o primeiro dos editores de fotografias e imagem para computador. Nem ele, nem mesmo o seu antecessor, o Photoshop 0.63, lançado em 1988.


Sabe quem foram os pioneiros nas técnicas de arrumar as fotos? Os americanos? No! Os ingleses? No! Os alemães? Nine! Os franceses? Non!


Os soviéticos foram os primeiros a usar em larga escala, a edição de imagens através de sistemas arcaicos de edição.

Você acha que não?



O vídeo está em russo, mas que logo em 1987, já existia um software da antiga CCCP (URSS) para a edição de imagens, aqui representadas pela Cavalaria Vermelha na Guerra Civil Russa.


Ainda não te convenceu?



Pois bem, isso ainda não é nada. A técnica de edição de imagens é ainda  mais antiga. Vocês duvidam? Provarei.


 Nikolai Yezhov (Iejov, em português nosso de cada dia) fora torneiro mecânico na fábrica Putilov em Petrogrado (uma fábrica de armas), nasceu nos arredores de uma vila chamada Marijampole, na atual Lituânia. Era fluente em Russo, Polonês e lituano. Ele acabou ingressando na Guarda Vermelha, na Revolução Russa e com a formação da URSS, tornou-se agente da Cheka (a Polícia Secreta).

Yezhov acabou angariando posições e chamando a atenção do próprio Stálin, que o acabou o promovendo ao chefe da nova polícia secreta, o NKVD (o antigo chefe havia sido preso, por supostamente estar envolvido numa conspiração que matou um dirigente do partido, Kirov).
File:Nikolai Yezhov conferring with Stalin.jpg
Foto dele conversando com Stálin
Yezhov tomou mais e mais poder, e ele, em companhia com o Promotor-Geral da URSS, Vichinki, promoveu o que seria conhecido como os Expurgos de Moscou, que liquidou de uma só vez toda a possível oposição ou não ao Partido Comunista.

Mais e mais foi-se descobrindo o quanto de poder que Yezhov ia acumulando, ele se tornara um alcoolátra, um pervertido e um torturador sádico. Achava que tinha um poder maior que o próprio Stálin!

Promovia toda a noite orgias com as dançarinas do Mariinski, regadas a bebida, e pornografia alemã (que ele substraíra do seu finado antecessor) e acabou se por fim promovendo orgias bissexuais com os seus amigos mais próximos (eca!).

Stálin ficou sabendo disso, e mandou fuzilá-lo.

Isso não  era incomum para aquela época, em que Stálin mandava fuzilar seus amigos mais próximos, pessoas inocentes de aldeias distantes, e até membros de sua família. O incomum foi o que veio a seguir.

Os censores do NKVD providenciaram a total exclusão de Yezhov de todas as fotos oficiais em que ele aparecia com Stálin, varreram todos os seus documentos e pertences, mandaram fuzilar sua esposa (que não era santa também, ela tinha relacionamentos extraconjugais com diversos artistas da URSS) e levaram sua filha adotiva para um orfanato.
Foto dele caminhando com Stálin ao longo do Rio Moskva, note Molotov (de chapéu) olhando para aquela pequineza!



Uê! Desapareceram com o homem até nas fotos! E Molotov tá olhando pro nada!




Se fudeu! Yezhov, o que você plantou agora comerá pela raiz!


Num faz isso, seu doido! Você não sabe o que tá fazendo!

Trotsky foi o único carinha doido o suficiente de peitar Stálin tête a tête, mas ele pagaria por isso...




File:Soviet leaders Red Square Moscow 1919.jpg
Foto de Trotsky com Lenin
File:Soviet leaders Red Square Moscow 1919 - Altered.jpg
Uê! Cadê o carneirinho?
 Agora dá pra concluir que a edição de imagens é anterior ao fenômeno do photoshop e é usada com propósito políticos desde antes de aparecermos nessa Terra maravilhosa.







Essa distorção que pode alterar toda uma interpretação, modificar o curso como a História se desenvolve ou simplesmente pode não haver efeito algum

E daí que foi photoshopada? Ela continua gata do mesmo jeito!

Haber e o uso da ciência para o "bem" e para o "mal"

A figura mais controversa pra mim na história da Ciência não é Oppenheimer (pai da bomba nuclear), nem Alfred Nobel (criador da di...