domingo, 16 de outubro de 2011

Réquiem a um pianista

Canta a ultima sinfonia o já cansado pianista... Canta-lhe a vida o último suspiro.

Paris,  a cidade de Luz. La belle ville. Sim, Paris. A cidade com largos paços, belíssimos boulevares, estonteantes palácios, fervor intelectual e político respira-se por aquele lugar às margens do rio Sena, defronte a Catedral de Notre Dame...
Por ali perto que se inaugurou o Arc de Triomphe, por ali, cavalgou Napoleão ao comando dos seus exércitos há meio século atrás. France, le petit bijou.
  Fazia um ano Frederic Chopin já não tocava, ele dera seu ultimo concerto em Paris em 1848, com a saúde bem debilitada... Tossia com demasia, tossia roucamente por longos períodos, que sua voz foi se esvaindo com o tempo...
 Frederic sempre tivera a saúde muito frágil para ser sincero. Frederic era rapaz homem mediano, de olhos cansados, nariz grosseiro e cabelos um tanto cheios para um homem; sempre era conhecido por vestir sua casaca negra e fumar quantidades absurdas de charutos.
— Frederic, pare de fumar. Isso não faz bem para você! — Gritava-lhe suplicante George Sand.
— Ah, deixe-me, meu amor, o único prazer nessa vida além de você são os meus charutos.
— Oh! Frederic!
— Oh! George.
Os dois ali, naquele divã, se beijaram. Frederic e George. À primeira vista, essas duas figuras masculinizadas de casaca e calças poderiam dar mostras de uma relação homoafetiva no século XIX, mas não era esse o caso...
George Sand não era homem, isso mesmo, não era homem. Ela era na verdade a baronesa de Dudevant, a senhorita Amandine Aurore Lucile Dupin, carinhosamente chamada por Chopin de Aurore (Aurora), ela era uma renomada escritora francesa, embora na França não fosse aceito o ingresso de mulheres em liceus, Aurora rapidamente transgrediu essa norma ao travestir-se de homem e usar o noun de guerre de George.
Ela com certeza era uma das pouquíssimas pessoas em toda a primeira metade do século XIX a ter aderido às ideias socialistas e isso divertia em certa maneira Chopin.
— Meu amor, minha vida.
— Aurora...
Fora ali, naquele divã, que eles passaram a noite, como um casal, à luz dos candelabros, enquanto chuviscava em Paris.
Apesar de estar usando casaca e de estar sem maquiagem, Aurora era bonita, uma beleza à la France;  ela tinha longos cabelos negros,  um olhar encantador, meio suplicante, era um pouco pálida, tinha boca sensual e era um pouco magricela. Ela era bonita.
Chopin se lembrava com orgulho da noite que tivera ali, naquele divã que agora estava deitado, o quanto se divertira naquela noite de amor, mas agora tossia tão forte quanto uma locomotiva. Uma tosse tão chata que até os vizinhos começavam a reclamar.
— Ludwika... Ludwika...
— Sim, Frederic?
— Acho que eu não passo dessa noite.
— Não fale assim, Frederic.
— Eu queria que você soubesse que sinto muita falta de nossa terra, mas não mais tiver coragem de voltar à Polônia.
— Eu entendo, Frederic. Eu entendo.
— Só quero que saiba que vou sempre amá-la, minha irmãzinha... COF! COF!COF!
Frederic lembrava do dia, quando ainda era criança na Polônia quando sua irmã, Ludwika o ensinou pela primeira vez a tocar o piano, era um piano escuro, um pouco estridente, que se empoeirava com certa frequência, mas fora naquele primeiro piano que Chopin tocara.
Ele tinha dez anos.
Naquele divã, Chopin descansou os olhos e não mais acordou, agora ele seria imortalizado postumamente como o músico mais importante da Polônia. Chopin morreu nas primeiras horas do dia 17 de outubro de 1849.
Morrera de tuberculose, embora alguns digam que foi fibrose pulmonar, Chopin morrera de tuberculose e no seu testamento exigia que algumas coisas pudessem ser feitas por seus amigos.
— Vai demorar muito, Clesinger? — Questionou Ludwinka, totalmente chorosa, ao perceber que o seu irmã morrera ali, defronte a seus olhos.
— Só mais um pouco...
— Eu não entendo porque Frederic pediu que fizéssemos um molde de sua mão.
— Para que fosse póstumo, Ludwinka. Para que fosse póstumo.
...
“Meu querido irmãozinho, sempre soube que o seu coração pertencia à Polônia, à nossa terra natal. Assim mando-o para a nossa Polônia embebido no mais fino conhaque.
Ludwinka”

Na verdade Chopin tinha medo de ser enterrado vivo, assim em seu testamento ele pedia para que retirassem seu coração e o enviassem para a Polônia. Ludwinka o colocou em uma urna, embebido de conhaque e o mandou para Varsóvia.
O coração permanece até hoje lacrado dentro de um pilar da Igreja da Santa Cruz (Kościół Świętego Krzyża) em Krakowskie Przedmieście, debaixo de uma inscrição do Evangelho de Mateus, 6:21: "onde seu tesouro está, estará também seu coração".
No dia 30 de outubro, Chopin foi enterrado, no cemitério Père Lachaise, em Paris, ao som da sua Marcha Funébre da Sonata Op. 35.
— Para que descanse em solo polonês, trouxemos, meu amigo, esse pedaço de terra da nossa querida terra natal, Frederic.
Os seus amigos lançaram o punhado de terra sobre a cova onde até hoje descansa o pianista Frederic.

Tumulo de Chopin em Paris
             Descanse em paz, Chopin.
  

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