sábado, 17 de março de 2012

O crime do sensacionalismo

       Nas últimas semanas, no Brasil, assistiu-se apreensivamente o resultado de um único julgamento: O de Lindemberg Alves.

       Lindemberg, nada a ver com o às da aviação pseudonazista americano, Charles Lindbergh e seu Spirit of Saint Louis (a não ser o fato de que ambos, de maneiras diferentes, figuravam a trama de crimes de comoção nacional), efetuou um cárcere privado em 2008, que durou por quase cinco dias, mantendo como reféns a sua ex-namorada, Eloá, e a amiga dela, Nayara.

Ficheiro:Caso Eloá.jpg
Eloá Cristina durante o Sequestro
       Lindemberg aparentemente não aceitou o fim de seu namoro, e decidiu sacar uma arma contra a sua ex-namorada e intimidá-la com o seu espírito ciumento... Era o ínicio do sequestro mais longo que já se viu em toda a televisão.

     Sim, isso mesmo, o evento foi todo televisionado, em todos os canais! 24 horas por dia! Os cinco dias daquela estafante semana.

      Com a mídia filmando tudo que se passava no edíficio, a polícia via-se prisioneira de um plano de ação que não pudesse dar muito na cara, afinal de contas, o sequestrador estava vendo tudo pela rede nacional.

      O pior nem foi isso, afinal a mídia fez o seu papel de informar. O pior foi a televisão ter dado audiência para um criminoso, isso mesmo, Lindemberg falou em rede nacional tudo o que pensava...

       Lindemberg entrou em rede nacional, patrocinado por uma pseudojornalista de quinta categoria como a Sônia Abrão e começou a falar feito um louco que ia matar a todos no apartamento, mas eis o que a Sônia Abrão faz? Ela toma para si o papel de negociadora da situação, isso mesmo tomou para si o papel de mediadora.


                                    Trecho da Sônia Abrão falando com o sequestrador em Rede Nacional


         A Sônia Abrão com certeza atrapalhou em muito o papel da polícia quanto a negociação, afinal isso cabe ao negociador e não ao jornalista. A polícia já não estava conseguindo negociar com o infeliz e vem um reporter, que não proeficiência em tais assuntos, e tenta se dar de negociador... Ah, é querer fuder tudo.



        Se fosse só a Sônia Abrão, mas os pastores da Record também tem culpa no cartório, pois televisionaram para dar audiência uma entrevista que eles conseguiram com Lindemberg Alves... Lindemberg teve o que tanto queria, o seu momento de fama, pela primeira vez em toda a sua vida, aquele metalúrgico obscurecido, excluído da sociedade, teve seu momento de fama quando entrou em rede nacional.

        Lindemberg Alves se tornou a pessoa mais famosa do país em uma única semana, todo mundo falava dele e como iria acabar. Pois então, eis que o Lindemberg achou-se poderoso e dono da situação, dando agora ordens, como um patrão, aos policiais e a mídia, atirando contra os populares para intimidar, para se sentir mais poderoso.

Era todo dia esse edificio passando na TV

        O Magnum punctum foi com certeza quando uma das reféns, Nayara, foi libertada, e furando o cerco policial, retornou ao cativeiro para se encontrar com a amiga. Também televisionado pela televisão, choveram indagações, reclamações sobre o fato disso ter acontecido, todas por parte de comentaristas de Televisão, como Percival de Souza, dizendo que a polícia foi omissa e que estava arriscando demais... Mas cadê que eles tinham feito algo melhor, eles só ficaram atrapalhando o trabalho já ruim da polícia.




        A polícia já estava cansada de tudo aquilo, chegara ao quinto dia sem grandes progressos, e todos convenhamos, teríamos ficado revoltados com tudo aquilo (se eu pudesse, teria invadido o apartamento com uns trinta homens da Mossad ou da KGB no terceiro dia, só de raiva para a Mídia parar de bater na tecla: "Lindemberg está sequestrando, Nayara isso, Eloá aquilo..."), pois eis que a polícia chegou ao seu limite e decidiu invadir.
Lindemberg preso

        O batalhão de choque da Polícia Paulista, a Rotam, preparou seus homens com escudos e decidiu invadir o apartamento subindo as escadas externas do edíficio, enquanto um policial especial, iria com uma escada para uma janela estreita do banheiro, onde se pensava em retirar as réfens. Ao ouvir um disparo, a polícia invadiu.


        Lindemberg disparou sua arma, presumo eu, porque viu tudo pela televisão, e sabia que tinha chegado ao fim.


        
Tudo foi muito criticado, a abordagem da polícia, por ter usado uma escada de parede, aquelas que usamos pra pintar parede, para acessar o apartamento, subir as escadarias externas do edíficio com um número
Equipamentos de última tecnologia!
considerável de soldados. Mas o que a mídia não entende é que não parecia mesmo haver outro jeito.
 
       Poder-se-ia usar rapel, mas como a janela do banheiro, a única aparentemente acessável sem que o sequestrador a visse, era no vitrô e estreita, o que atrapalhava a entrada dificultosa que seria enfrentar o vitrô. A outra oportunidade era usar os snipers, mas além da janela pequena que atrapalhava tudo, ainda tinha o risco da mídia criticasse se algo errado acontecesse, ou mesmo o pessoal dos direitos humanos iria apelar que o assassinato teria sido ilegal e iriam processar a polícia.

Isso também não é Call of Duty!
       Qual seria a solução para a mídia? Construir um elevador?



       Culpa-se muito a polícia por tudo, mas sejamos sinceros, a polícia deixou muito a desejar, esperou demais, contudo e a mídia? Vai sair impune? Foi a mídia que atrapalhou em boa parte o serviço já ruim da polícia.


        Mas isso se esqueceu quando se tratou no julgamento, os jornais e noticiários tentaram de toda maneira esconder sua culpa para debaixo do tapete, quando enfim esqueceram depois de todos esses anos o acontecido, e agora, perto ao julgamento, tentaram mostrar todo o julgamento com todas as alegações, tanto da defesa quanto da acusação, mas sempre culpando Lindemberg Alves.

O criminoso nessa foto
        O engraçado que na época esse infeliz era tratado como coitadinho, um sequestrador desequilibrado sem muitas oportunidades na vida que num momento de loucura foi movido a isso, a mídia tem uma atração para fazer reportagens de "falsos coitadinhos", mas quando a opinião pública não aceitou, os telejornais tomaram uma posição firme de que Lindemberg era um assassino, um criminoso e que devia ser punido exemplarmente, talvez porque a mídia mesmo se sentisse culpada por sua ação. 
 

       Sim, essa espetacularização de um crime foi criminosa, vejam por exemplo o caso da Sonia Abrão, ela conversou ao vivo com Lindemberg Alves e Eloá por telefone, bloqueando a linha que era utilizada para contato com o negociador.


Tá feliz porque vendeu a sua Tekpix
           Não  a toa que o ex-integrante do BOPE (Batalhão de Operações Policiais Especiais) e sociólogo Rodrigo Pimentel  (o mesmo cara que ajudou o criador da série Tropa de Elite) criticou duramente a cobertura da mídia brasileira argumentando que as emissoras de TV citadas - RedeTV!, Rede Record e Rede Globo - foram "irresponsáveis e criminosas" e declarou que o "Ministério Público de São Paulo deveria, inclusive, chamar à responsabilidade, essas emissoras de TV".


         Não só isso, a mídia, mesmo depois de Lindemberg ter ferido Nayara no rosto, e matado Eloá com três tiros, continuou a retratá-lo quase como "coitadinho" na época, um vídeo feito por um policial e divulgado com exclusividade por um renomado jornalista no Jornal da Record, mostra Lindemberg prestando depoimento completamente nu, com as mãos algemadas para trás e o rosto visivelmente inchado, o que poderia indicar que foi espancado.

        A Corregedoria da Polícia Civil abriu inquérito para investigar quem foi o policial responsável pelo vazamento das imagens. De acordo com a Folha de S. Paulo (jornal impresso), as imagens teriam sido negociadas por 50 mil reais com quatro policiais, o que inevitavelmente ligaria a rede Record de Televisão a um esquema de corrupção. Obviamente, a Record negou, afirmando que o vídeo é fruto de sua "equipe arrojada de jornalistas".

         Pois bem, a mesma mídia que antes passou a mão na cabeça de um assassino agora, para se proteger, o culpa e quer uma punição exemplar. Por que não fez isso antes?

         Lindemberg teve uma defesa assustadoramente eficiente, na qual a advogada foi retratada como um verdadeiro Anti-cristo pela mídia, mas acabou sendo condenado com a pena máxima por seus crimes (justiça seja feita) a 98 anos e 10 meses, muito embora um réu no Brasil não possa ficar  mais de 30 anos na prisão.

Essa moça quase foi apedrejada em praça pública


       Mas e a polícia? Até hoje está sob investigação, sobre suas ações visivelmente falhas, e a familia das vitímas agora deseja uma indenização milionária do Estado.

       Pois e a mídia? Essa, essa seguiu impune.


       Bem, eu só não conto as piadinhas do Twitter, porque não quero ser processado pela Sonia Abrão, mas vocês agora sabem o que eu penso sobre ela e toda a mídia como um todo.

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