terça-feira, 30 de abril de 2013

Uma sensação de perseguição

      Um dia desse eu  achei que você estivesse me perseguindo, encontrei você umas duas ou três vezes nas minhas caminhadas nos corredores da vida, o que é  algo muito estranho, afinal quem diria que eu gravei o seu rosto no anonimato de toda uma multidão: Sim, eu gravei sem querer.

      É mais estranho ainda pensar que você estava olhando para mim quando eu estava distraindo redigindo algum ensaio que não teria fim, você me pegou desprotegido com o seu olhar de serpente; O que você estaria pensando de mim afinal? Eu realmente não sei e conjecturo não querer saber, afinal de contas a ignorância às vezes é uma benção.

      Entrei numa sala e encontrei meus amigos à porta cantarolando músicas bregas e sorrindo com as maiores trivialidades da vida; A cortina de fumaça do cigarro irritou minhas narinas e decidi tomar um pouco de ar, foi aí que você apareceu de novo: Com sua sandália rasteirinha, uma pulseira no braço esquerdo meio tribal e os cabelos meio à la hippie. Achei meio estranho, não esperava encontrá-la naquele digníssimo antro,  mas fora deveras compreensível pensar que você fora arrastada pelos amigos.

      Fui para a minha aula e conversei com alguns colegas sobre isso; Quando estava indo para casa, vi você correr em direção ao mesmo ônibus do que o meu. Eu estava meio desligado e entrei na frente de maneira um tanto grosseira, não era de se esperar cortesia de alguém que tivera aula o dia todo, mas foi então que ao ir para o meu lugar, você disse com voz angelical um "Boa Noite" bem tímido; Não lembrava que houvesse ainda educação nas palavras das pessoas no cotidiano, mas realmente você foi bem educada.
   
       Fingi não me importar com isso e me sentei junto à janela, foi então que você sentou do meu lado. Só podia ser uma conspiração cósmica, pois aparentemente não havia lugares melhores do que aquele ali; Perguntei a mim mesmo se estava sendo bem galante naquele dia e sorri com a tolice que essa ideia trazia. Coloquei meus fones de ouvido e fechei meus olhos, adormeci com você ao lado admirando as obras do Niemeyer da janela do coletivo.

       Alguns teriam dito que eu devia ter puxado alguma conversa com você, mas a vida é tão cheia de singularidades que meras coincidências não são lá muito aproveitadas por nós, pessoas descuidadas, e afinal de contas, que conversa teríamos nós em comum? Dormi tranquilamente e quando acordei você já tinha saído, nem me importo com isso.

      Calibrei meus olhos à claridade da iluminação pública, retirei o meu fone de ouvido depois de duas músicas, e desci na minha quadra como sempre fiz. Nunca mais te vi, é verdade, e é possível que nunca mais te verei, mas não sinto qualquer coisa sobre isso; É tolice acreditar que existe algo além em meras coincidências.

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