segunda-feira, 14 de janeiro de 2013

A velha Olivetti



       Quanto tempo não é mesmo?

       Passo a mão delicadamente no seu corpo metálico, dedilhando as teclas pesadas do seu mecanismo. É uma pena que tenha ficado tanto tempo parada, logo você que foi aquela criatura mágica na minha infância, o pequeno portal mágico para o conhecimento.

       Te salvei de uma boa não foi mesmo? Iam jogá-la fora, num lixo comum e você estaria esquecida em algum canto no meio do entulho. Não tive a mesma sorte com a vitrola, não consegui salvá-la, nem mesmo aos antigos discos de vinil de meu pai. Como pude deixar isso acontecer?

      Minha pequena máquina de escrever, tão singela e tão retrô. Eu gosto de você como a minha primeira professora, qual o nome dela? Jane? Foi ela que me ensinou os ofícios da escrita e da leitura, mas foi você que me ensinou como deveria martelar as teclas.

      Pena que esteja tão empoeirada minha querida criatura, que não tenha mais tinta no seu refil e eu não tenha como arranjar outro por esses tempos, mas saiba que eu gosto muito de você. Você não é só uma máquina de escrever barulhenta e um pouquinho lenta como dizem, você é mais do que isso, você é parte da minha memória, da minha infância. De como a minha mãe usufruía dos seus serviços para martelar teclas nos livros de contabilidade e de como o meu pai redigia pedidos e os enviava pelo aparelho de fax. Aparelho de fax! Minha nossa! Ainda temos isso!

      Nossa, quanto tempo faz? Quinze anos talvez? Nunca mais vi um fax à venda, assim como máquinas de escrever. O progresso chegou e ele não acompanhou minhas lembranças. Queria eu mostrar aos meus filhos um dia o que você fez por mim, o que você me ensinou quando criança, de como eu me escondia no escritório de meu pai, por entre as mesas de madeira e os papéis nos fundos de casa, e redigia uma ou duas palavras num papel sulfite que ficava largado.

      Papai nunca gostou muito que eu mexesse em você, sabia? Ele sentia um pouco de ciúmes, só quando o computador chegou, ele te trocou sem qualquer cerimônia. Eu senti pena de você, sério mesmo, você deve ter ficado tão triste e desolada, confinada no armário da sala sem qualquer uso, você quase foi pro lixo. Ainda bem que eu te salvei.

        Perdoe-me por não escrever mais no seu teclado, no seu esqueleto pulsante, mas ainda não consegui achar aquele maldito refil que escreverá as minhas doces palavras. Mas saiba que eu gosto muito de você, minha velha Olivetti.

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