terça-feira, 8 de janeiro de 2013

A sombra de Bolívar


   



     


        


         

 
" Se apenas um homem fosse necessário para sustentar     o Estado, esse Estado não deveria existir; e ao fim não existiria" Simon Bolívar






         A figura de Simon Bolívar é uma das mais enigmáticas e controversas da América Latina, e em tempos como os nossos, com a expansão do "pensamento bolivariano" é conveniente tomar algumas conclusões sobre essa personalidade, e mais do uso de sua imagem.

            Bolívar  a despeito de todo o conhecimento dito "bolivariano" produzido de forma não acadêmica por alguns ideólogos latino-americanos, foi sim um grande libertador da América Latina, mas com ressalvas:

           A figura de Simon Bolívar é tida como um professor da verdade, que levou a palavra igualdade em todos os cantos que passou, mas trás um problema, pois a despeito do que se pensa, Bolívar não era um proto-Lênin, ou uma versão oitocentista de Che Guevara, muito pelo contrário, Bolívar era membro da elite venezuelana.


          Simon Bolívar sequer era um republicano que acreditasse na democracia bicameral, ele em seus escritos mostrava uma postura profundamente elitista, enumerando que a maioria da população era inculta e analfabeta, e que cabia à elite governar por meio da Ditadura, na qual por um Destino Manifesto, que ele sentiu após visitar Roma, ele deveria liderar, nem devo dizer a decepção de Simon ao perceber que ele não teria isso.

         Mas uma coisa era totalmente verdadeira, ele sim era a favor da unidade dos antigos territórios da América Hispânica, mas como? Com a liderança da Venezuela é claro.


       Então, por que eu estou falando isso? Por falar Bolívar e não de San Martin, Rosas, Urquiza, Mitre e outras personalidades latino-americanas? Por uma simples razão, nenhuma personalidade, tirando Rosas e Peron, sofreu uma falsificação tão grande da História na América Latina por um viés ideológico do que Simon Bolívar.

       E sim chavistas, estou atacando o seu deus.

E sim, eu continuo acreditando que ele é uma releitura de Benito Mussolini


       Mas tenho um bom motivo, a conjectura venezuelana atual nos faz pensar a que ponto chegamos na América Latina.

       Hugo Chavez, presidente da Venezuela, que a despeito de todos os rancores e fascínios sobre sua pessoa, trouxe um regime bem inusitado para o século XXI,  um governo de base popular populista que se diz socialista, e digo se diz porque um estado que se diz socialista, tenta promover reformas sociais, ataca o dito imperialismo yankee e tem como maior comprador de petróleo os Estados Unidos sequer merece ser levado à sério, parafraseando Charles De Gaulle.

De onde acha que boa parte da receita venezuelana é gerada?


    O que eu tenho a levar em consideração é o que o chavismo anda trazendo à América Latina, um discurso doutrinário de bolivarianismo, embora eu seja integralista até o último suspiro eu não vejo como benéfica a sensação de uma união de ditaduras na América do Sul, tal como Bolívia e Venezuela andam fazendo e o Equador fez parte. Na verdade, essa união bolivariana se pauta pela história de Simon Bolivar, que libertou a Venezuela, Colômbia, Equador, o Peru e a Bolívia (tanto que se chama Bolívia) do domínio colonial espanhol, a liga ideológica que faz com que esses povos se identifiquem é a história, assim como os fascistas e o nazistas se identificavam entre si por terem feito parte de um único império, o Sacro Império Romano-Germânico. Percebam o perigo.



    Nesse interim, a velha e boa conhecida Argentina, que no século passado já teve a quarta maior renda per capita do mundo, que já vem cambaleando das estribeiras, perto de cair, principalmente por causa da bancarrota dos bancos nos anos 90, vive amargamente um período de instabilidade em que o governo populista de Cristina Kirchner vem fazendo com que o governo perca ainda mais apoio popular, dessa forma acabe tentando tomar apoio de outras nações, aí entram as parcerias argentinas com a Venezuela e a Bolívia.

    E o Brasil? Brasil também é bem amigável com Chavez, fazendo de tudo para ter boas relações com esse vizinho rico em petróleo, principalmente porque o PT, Partido dos Trabalhadores, de Lula vê com afinidade as ideias populistas desse governante bastante controverso.

Os dois eram amigos, não nos esqueçamos disso

   A questão é, todos os países da América do Sul, com exceção do Chile e da Colômbia, por razões ideológica, e o Paraguai, que por sua vez perdeu voz, em maior ou menor grau dão amparo à política chavista e muitas vezes são simpáticos à ela. De fato, ela se expande de tal maneira quanto o fascismo ditatorial se expandiu de maneira avassaladora na Europa dos anos 30 (Portugal, Espanha, Alemanha, Itália, Polônia, todos esses países caminharam para regimes ditatoriais, e apesar que se diga o contrário a constituição polonesa da década de 30 era uma das mais rígidas da época).

Lembremos dos mapas da expansão do autoritarismo na Europa de 30
    Existe outro caminho na América Latina, que tenta não se espelhar no modelo chavista de governo, que acaba sendo um tanto retrogrado; Esse modelo diferente vem sendo adotado pelos seguintes países: Colômbia, por razões diplomáticas um importante aliado dos EUA, Brasil, por ser a potência regional e estar em uma boa fase se comparado a outros tempos, Uruguai, principalmente porque a figura carismática de Mujica não parecer se interessar em um modelo ditatorial, mas uma modelo democrático e de reformas, e o Chile, que mesmo assim anda passando maus bocados.


      Esses grupos de países se cristalinizaram no cenário regional da América Latina. E embora tenham alguns excessos, o grupo dos países II, com Colômbia, Brasil e Uruguai, se expressa por um grupo de países basicamente democráticos com supro respeito às instituições e leis, e embora no Brasil esteja nascendo uma espécie de lulismo, e tenha corrupção, ainda assim o culto à personalidade não é marcante, o mesmo não pode-se dizer dos países bolivarianos mais a Argentina.

      Ah, Argentina, por que és assim? Você com os seus tangos, seus cafés maravilhosos, por que se deixou levar a esse ponto? Justo você que era a rainha da América do Sul. Por que você se seduziu por esses que nada lhe oferecem senão mais e mais sofrimentos?

Argentina, Argentina, dourado é o  sol, prateados são seus rios

      Embora a história seja uma coisa muito viva na Argentina, ao contrário do Brasil, onde você não ouve senão dos militares os nomes Caxias e Tamandaré, mas ouve dos argentinos Mitre e Rosas. Você não ouve Getúlio, mas escuta Péron na Argentina, aqui se brinca com a política, lá se fazem discursos apaixonados. Como somos tão diferentes! E ainda bem que somos diferentes, porque juntos podemos ser maiores que a soma de ambos.

     Por que Chavez faz tanto sucesso? Serão seus discursos, os seus atos, ou simplesmente por ele dizer que se importa com o povo, coisa que os seus antecessores ignoravam? Tá mais para a última mesmo, mesmo assim, como pensadores trotskistas podem se ver vangloriados quando se lembram de Chavez, esse homem que tem um culto à personalidade à sua volta?

     Simples, os trotskistas nunca foram muito democráticos, sempre foram um pouco a favor da Ditadura do Proletariado, atacaram o culto à Stálin, unicamente porque não havia um a Trotsky. Eles se seduzem pela ideia do  bolivarianismo porque ela lhes parece com a ideia da Revolução Permanente, mas uma revolução sem o Brasil, logo a potência regional?

Isso é culto a personalidade tão semelhante ao de Stalin


     Mas o que Chavez trouxe? Ele trouxe políticas de amparo social, verdade, ele estatizou empresas estrangeiras, sim e... e nada, não mudou o quadro econômico, denunciou um golpe, na verdade ele sofreu mesmo, porque essa coisa latino-americana de dar golpes é tão triste quanto a hipocondria européia. Mas o que acontece com a Venezuela, um país que vive de petrodoláres e ainda assim não enriquece. Um país que podia ser a Arábia Saudita tropical, mas parece mais um cenário dos filmes do Rambo.

     Sabiam que a Venezuela importa ovos. Eu disse ovos. Um país que importa ovos é pura constatação de sua fragilidade produtiva, afinal, um país que não produz comida para o seu próprio consumo está fadado ao fracasso. Importar ovos, a União Soviética importava comida, e veja o desfecho dela, quando não conseguiu pagar tudo entrou em crise.

     Na verdade a situação da Venezuela é semelhante à da URSS. Embora a Venezuela tenha um clima mais propício à agricultura, ela não parece ter diversificado essa questão, muito pelo contrário, ela cada vez mais fica dependente do petróleo, a URSS também ficou dependente do petróleo  tanto que na Crise do Petróleo  ela vendia para o exterior e com dinheiro comprava comida. Mas quando o boom do petróleo acabar? A Venezuela estará fadada ao que aconteceu com a URSS, uma crise de desabastecimento.

É irônico, A Venezuela, rica em petróleo passa por um desabastecimento de comida, e nós ricos em comida, passamos por um desabastecimento de combustíveis.

     Na verdade ela já vive essa crise, e ainda vive com uma inflação galopante, mas pelo menos a gasolina é barata, mas é todo mundo que tem carros? Na verdade, quais são as indústrias automobilísticas na Venezuela? Muito poucas.

     Agora falemos em leis, qual é o respeito à constituição, há estabilidade jurídica, ou as regras mudam sempre? As regras do jogo mudam sempre, estatizações (eu sou inteiramente a favor das estatizações, mas também não pode ser uma coisa que pega todo mundo de surpresa), inadequações de gerência, crises fiscais, mas pior que isso a lei muda, a constituição é reinterpretada. A constituição!

      A constituição venezuelana previa que um governante devia no máximo ter dois mandatos consecutivos, Chavez e os seus apoiadores conseguiram mudar esse artigo, fazendo com que não aja limite para a eleições. É certo que os Estados Unidos tiveram FDR em quatro mandatos, mas é diferente, na época não havia uma legislação que restringia o número de mandatos, ela surgiu quando Roosevelt morreu, mas mudar a constituição para fins próprios é uma grave falha dos parâmetros jurídicos de uma sociedade.

      A oposição na Venezuela não possui apoio popular, igual ao Brasil, mas anda crescendo nos últimos anos. A questão dela estar crescendo é que Chávez anda perdendo popularidade em virtude da inflação e de o país estar amargando a crise econômica de 2008. Mas o respeito às leis também algo a ser levado em consideração, sem falar na saturação de sua figura mesmo.

     Em todo caso, Hugo Chavez está doente, ele está doente e a Venezuela é o "velho doente" da América. O fato de o tratamento de Chavez não ter sido feito na Venezuela nos explica muita coisa, a medicina venezuelana não é boa, e pior Chavez não confia nos seus próprios médicos, mas se vangloria de estar fazendo uma medicina pública a todos os venezuelanos.


     Ao que indica Chavez iria se tratar no Brasil, no Sírio-Libanês, mas como a política do hospital não ampara uma política total de sigilo de figuras públicas e nem estava disposta a isolar uma ala inteira para o tratamento de Chavez, ele foi à Cuba. E conforme os relatos dos médicos espanhóis que estiveram em Cuba, os médicos cubanos fizeram uma barbeiragem e Chavez acabou ficando mais debilitado ainda.

     A pergunta é: Como um homem que sabe que está doente pode concorrer às eleições? Roosevelt fez a mesma coisa, mas FDR estava no meio de uma guerra, para ele até quando Hitler morresse ele não descansaria, mas talvez o próprio Roosevelt tivesse tomado gosto pelo poder. Essa é a explicação que tenho quanto à Chavez.

     Então, Chavez está tão doente que não pode assumir a presidência, não pode tomar sequer posse. Na verdade, a constituição é clara, quando o governante não consegue fazer o juramento de posse, por incapacidade ou invalidez, deve assumir o presidente da Câmara, e convocar novas eleições para 10 dias. Está na constituição, mas é conveniente também à oposição.

     Chavez está em coma induzido, mas em seu país parece um fantasma que assombra a realidade. Seus apoiadores acreditam que tudo isso foi legal e que não precisam de novas eleições, mas na verdade, eles têm medo de não poderem se garantir no pleito sem Chavez, enquanto se Chavez for dado como presidente, e por ventura morrer (e isso não está difícil), o vice assumirá e o status quo será mantido.


       Vejam só o que o chavismo anda trazendo a Venezuela, cabelos brancos. A instabilidade é tanta que não duvido nada que vai agravar ainda mais a situação econômica e política desse país já tão sofrido além do Equador.

     E é por isso que volto à citação de Bolívar: "Se apenas um homem fosse necessário para sustentar o Estado, esse Estado não deveria existir; e ao fim não existiria". É o que anda acontecendo, o Estado anda desaparecendo, tal como suas leis e sua constituição, que prosopopeicamente é tão pequena quanto o respeito que os discípulos de Hugito parecem ter com as leis.

O valor da constituição no caso da Venezuela pode também ser medido por seu tamanho
     

         

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