Adeus camaradas, pois aqui nosso destino nos alcança. É aqui que desço na longa ferrovia da vida.
Foi bem aqui que anos atrás saltei para conhecer o Mundo, e agora é aqui que me desapego de tudo que é impuro.
Eis que na minha jornada vi as mais diferentes pessoas, com os mais diferentes costumes, todas vis e mentirosas, e aprendi desde cedo a confiar em nenhuma delas.
Quantas coisas fizemos, quantas passeatas lutamos, quanto vinho tomamos... Foram bons tempos.
E pensar que não foi tanto tempo assim. Como queria eu ser uma andorinha que se assenta em qualquer canto, depois de uma longa viagem e no dia seguinte levanta voo nessa vida bem cigana que é a de uma andorinha.
Mas não sou, eu não sou uma andorinha, apego-me a terra e a todos que nela vivem... Sim, sim, conheci uma pessoa, que não espero encontrar nessa estação. Uma pessoa que no íntimo pensei ser boa, e no fim se revelou ser, e eu ruim.
Ela sequer deve saber que eu existo, sequer olhou para mim naquele dia... Não a culpo, não olharia para mim mesmo se visse a grande desfeita que havia feito naquele local... E pensar que não foi tanto tempo assim, foi numa estação qualquer da vida, há não um mês atrás.
Hoje me despeço com uma dor no peito, pois saber que agora não os mais verei é tão triste quanto arrancar meio braço lentamente, mas sei que assim é melhor para nós, afinal de contas cada um com o seu caminho. Adeus camaradas.
Não olho mais para trás, não vejo mais as tolices que cometi e os amores que perdi. Não penso mais no passado, o futuro me guiará, como sempre me guiou. Viva vida.
Não penso mais nela, não penso mais naquela que destroçou sem cerimonia o meu coração. Por que pensar nisso? Ela nem se lembra de mim.
Penso que nessa nova estação talvez encontre outra, uma donzela tão linda e tão infeliz quanto eu agora sou... Trarei-lhe flores, consolarei o seu choro... Ficarei abraçado à ela noite e dia, escreverei odes melosas e todas as sortes de harmonias.
Queria que minha vida fosse assim, no fundo, eu queria. Mas eu sei que ela não é assim, não é um poema qualquer cheio de rosas de um poeta fatalista do fim dos séculos, mas eu gostaria que fosse assim.
Lá está ela, de cabelos negros, rosto bem feito, e cabelos recentemente cortados... Bonita, serena, comum. Aquela, vês, a de moletom preto, com os cabelos curtos e sorriso tímido do rosto, que tanto fala aos amigos e que brinca no outono de pular nas folhas secas. Será que dará certo?
Eu não sei, o caminho é pedregoso, cheio de cacos de vidro e não sei se tenho forças para enfrentar meu destino... Será que se eu sair daqui, ela pensará em mim?
Espero que sim... Pelo menos acredito que sim. Adeus camaradas, deem minhas notícias aos nossos companheiros de luta, aqueles do Partido, pois agora rasgo minhas insignias e vou em direção a outra vida. Adeus, camaradas. Adeus.
quarta-feira, 26 de setembro de 2012
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