domingo, 26 de maio de 2019

A República do Shallow Now

          "A República do Shallow Now
         (e também do Golden Shower)



         Diante dos últimos períodos de conturbadas relações sociais, o país que outrora dizia ter acordado agora assiste bestializado a estupidez sendo impregnada em todos os aspectos da cultura, sociedade e política.



         Isso é uma das heranças da nossa cultura política messiânica que ao mesmo tempo que procura heróis, salvadores da pátria, cria a autofagia dos seus próprios ícones: Antes foi Getúlio Vargas, depois foi o Médici, Collor, depois o Lula, agora Jair Bolsonaro. Ao mesmo tempo que o brasileiro pratica a idolatria, ele é iconoclasta;



          Contudo, o ícone criado pela classe média brasileira é feito à sua imagem e semelhança, um indivíduo sem refinamento intelectual, que tem posicionamentos absurdos e não consegue ter a raciocínio minimamente lógico para a suas próprias ideias, como diria Sérgio Buarque de Holanda, o brasileiro é um ser cordial, não por cordialidade ser entendida como educação ou polidez, pelo contrário, cordial no sentido do original, em latim, de indivíduo movido pelo coração, não pelo raciocínio crítico.



             Foi exatamente isso que moveu as pessoas que saíram hoje na defesa de Jair Bolsonaro, não foi raciocinalidade de fazer a análise desse governo que se arrasta por quase um semestre e não faz nada de construtivo para a política brasileira, que não trouxe benefícios à educação, à saúde ou ao combate à corrupção, pelo contrário, só trouxe malefícios. Os que foram protestar hoje foram movidos pelas emoções, ao invés do coração, foram movidos pela bílis, pela raiva e hostilidade aos outros. Assim é o também o governo Bolsonaro, movido pela bílis.



          O brasileiro continua desnorteado do seu papel de protagonista no processo democrático, continua a enxergar apenas aspectos pontuais sob um prisma raso. E o que mais incomoda aos olhos vistos é que se dizem patriotas, mas louvam bandeiras estrangeiras.



          A frustração no futebol acaba se tornando frustração política e cria-se mágoas e ressentimentos que alimentam a retórica do ódio que vivenciamos hoje. Nisso vemos uma série de absurdos germinados na cultura da mediocridade:



         Eis que me lembro do Nelson Rodrigues e o seu conceito: "Complexo de Vira-lata", o brasileiro envergonhado da sua derrota no futebol na Copa de 1950 (tal como agora foi na Copa de 2014 e tbm na de 2018) toma para si a frustração e introjeta um complexo de inferioridade em relação às nações do dito "mundo desenvolvido".



         Temos ainda que lidar com o sofrimento de ver pessoas comuns criando hostilidade aos intelectuais, criando as mais absurdas pseudoteorias possíveis para explicar suas próprias narrativas de mundo e enquanto isso o país afunda a olhos vistos no atoleiro da corrupção.



          Hoje observamos do tupiniquim middle class que ele louva os americanos, mas não sabe falar uma frase decente em inglês. Vemos ministros de estado falsificarem sem qualquer tipo de embaraço diplomas universitários, vemos pessoas cultuarem (de novo o messianismo) um youtuber como se fosse filósofo, sendo que ele nem concluiu o primário;



          E como o brasileiro médio defende isso? Preso na sua bolha social, interagindo apenas com quem referenda as suas ideias, assistindo a TV aberta até o cérebro derreter, tomando como verdades fake news de Whatsapp, uma legião de idiotas acaba se tomando como um grupo de sábios e notáveis.



         Enquanto não se tem consciência do que está acontecendo, o brasileiro está imerso na sua própria mediocridade: a economia patina, o desemprego aumenta, a diplomacia brasileira tornou-se subalterna aos interesses americanos e a educação (como assim?) está se tornando arma de chantagem de meia dúzia de jagunços para aprovar a reforma da Previdência. E sim, Reforma da Previdência, quem fala que tem que reformar a previdência são pessoas que já estão aposentadas ou são pessoas estúpidas que não se importam que elas próprias serão afetadas com o corte direto nas suas próprias aposentadorias.



           É por isso quando entramos nesse terreno perigoso de culto à mediocridade, a política se tornou um ofício pornográfico, com escândalos, baixarias e absurdos incentivados pelo próprio governo, criando uma escatologia resumida pela expressão do próprio presidente: "O que é golden shower?"



             E nisso a necropolítica neoliberalista se alimenta do fervor ideológico dos olavistas para alimentar os interesses do mercado financeiro, dos rentistas, para a reprodução de seu capital especulativo em detrimento do trabalho árduo do brasileiro. Para desvirtuar o foco principal do brasileiro aos problemas econômicos o olavismo incentiva e alimenta o ódio às minorias e aos opositores políticos, e por extensão, o governo desse anteparo ideológico para incentivar a construção protofascista (ou já posso chamar de fascista) do governo Bolsonaro.



            E falam com nenhum embaraço que apoiam o presidente que vai cortar verbas na educação, que vai permitir que idosos não se aposentem e sejam a trabalhar até morrer e que aceitam de bom grado que o dólar dispare. Eles aceitam que a gasolina também chegue a níveis estratosféricos, que todos tenham porte de arma (inclusive milicianos) e que o desemprego aumente para alimentar a falsa sensação de "eliminar o perigo vermelho".



            Retórica pura e estúpida.

             Quem criou isso foi Olavo de Carvalho com sua escolástica messiânica e sem profundidade alguma, em um esforço de utilizar os autores clássicos, como Platão, Aristóteles, e também conservadores, Olavo de Carvalho (que antes era visto como piada) se tornou um guru de uma extrema-direita que não está disposta a ouvir outras narrativas que não sejam as suas.



            Juntos e Shallow now.

            Numa tradução tosca e descabida da música de Nasce uma estrela, Paula Fernandes traduziu tudo, a medíocre tentativa do brasileiro de classe média em se portar como "esclarecido e educado" com um provincianismo descarado ao cultuar de forma acrítica a cultura norte-americana; A sua total falta de percepção da realidade, sua falta de capacidade cognitiva para entender o mundo ao seu redor e a sua falta de profundidade intelectual até nos debates políticos (e conspiratórios) que ele alimenta.



            Juntos e Shallow now (rasos agora)"
                                                                                         Scriptor Inquietus

         

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