domingo, 30 de março de 2014

O tempo deve estar surdo

Pelos Cáucasos sinceros
Pelas veredas secas
Nos bosques sombrios
Da eternidade vazia

Nos dias de luta
Nos dias de frio
Ontem, hoje, sempre
Estarei aqui
Estarei ali

Longe, perto
Sozinho
Contando histórias
Rindo das piadas

Sofrendo das amarguras
Das vidas sofridas
Dos dias de chuva
Temendo ditaduras

Tenho medo dessa vida
Mas tenho medo maior
De não tê-la como queria
Hoje falo com vontade
Amanhã falo sem dizer
Mas pelo menos falo

Azar de quem é silenciado
Noite e dia
Pela ditadura das palavras
Pelo erro das ideologias
Em tornar em religião
As ideias de um novo dia


Tenho sorte de poder falar
Tenho sorte de poder escutar
Azarado de quem não tem direito
De falar aqui que pensa
E apenas tem direito de ser silenciado

Sou poeta fracassado
Sou escritor mal-amado
Historiador sem dito mandato
Intelectual musicado

Tenho sorte em poder pensar
Sentir e dizer:
Nunca mais quero ser calado
Nunca mais quero ser silenciado
Nunca mais irei ser torturado
Não pela força, mas pelas ideias

Pois esse poema não é meu
Nem é tampouco seu
Mas é daquele que já morreu
E não pode dizer o que disse
Pois a ditadura não deixou

Abril de 64
Data infame
Dia impudico
Castração de nossos sonhos
Roubo de nossa alma

Nunca digam que esse golpe
Foi uma Revolução
Pois não se saiu do lugar

Edson Luiz
Carlos Marighella
Zuzu Angel
Juscelino Kubistchek
Carlos Lamarca
Vladimir Herzog
Tito de Alencar Lima
Carlos Lacerda
João Goulart
Abelardo Rausch Alcântara
Ana Rosa Kucinski Silva
Yoshitane Fujimori
Honestino Guimarães

Alguns conhecidos
Outros praticamente desconhecidos
Mas todos mortos ou desaparecidos

Muitos nem era parecidos
Outros só queriam ter vencido
Vivido ou sonhado
Muitos eram jovens,
outros eram velhos.
Algumas eram crianças

Filhos, pais, avós e netos
Mulheres, homens
Todos desaparecidos
Famílias destruídas

E tudo começou com uma Marcha pela Liberdade?
Que ironia!

Aos que desapareceram para sempre
Lutaram tanto e morreram
Na longa tristeza que foi
O dia que durou vinte e cinco anos
Pois digo vinte e cinco, mas na verdade
é cinquenta. Pois aqueles que morreram
não voltam mais

Cinquenta anos em cinco?
Bobagem, a ditadura fez isso em um dia
Só que para o mal.


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