Nós últimos dias um crime de grande repercussão
pintou as páginas de jornais e trouxe audiência às televisões. O caso
Pesseghini.
Nesse
caso, supostamente (ainda está sob averiguação pela polícia) o filho de 12 anos
teria matado a sangue frio o pai, enquanto estava dormindo, a mãe, a avó e a
tia avó. Teria ido no mais cumulo ato de frieza para escola e quando voltou
para casa, teria se matado perto da cama dos pais.
Como não
se bastasse o crime ser chocante pela própria natureza, a imprensa deu maior
destaque porque o casal em questão (pai e mãe) faziam parte da Polícia Militar
de São Paulo, de modo que para alguns aquilo era uma notícia que teria alto
retorno. Verdade seja dita, quando foi divulgado o assassinato, a mídia
metralhou a todos com notícias.
A mim não
confere o papel de julgar os métodos utilizados pela polícia para chegar as
provas, a mim confere criticar o papel criminoso da imprensa frente a
divulgação escandalosa do caso: Culpar os jogos como autores do crime.
Pelo comentário
logo a cima o jornalista Marcelo Rezende dá a entender que o jogo Assassin's
Creed é o motivador do crime, que o jogo era deveras violento e que teria
dado por isso feito o menino cometer tal crime, esse não é o caso. Um simples
videogame não faz uma criança disparar uma arma, se fosse assim estamos
considerando todas as crianças débeis mentais e que os jogos acabariam pautando
a vida das crianças.
Mas
fica a pergunta:
Até quando
a mídia tentará colocar os jogos como responsáveis pela violência, como
ocasionadores do ódio e da discórdia? Até quando continuar-se-á essa mentira
insolente devido ao total desconhecimento sobre a importância dos jogos no
processo cognitivo e de aprendizado das crianças, ou a total falta de
honestidade das redes de televisão que veem sua audiência ser suplantada pelo
domínio real dos jogos frente a sua programação infantil chata e obsoleta.
Não são
os jogos que causam a violência, na verdade, eles são um meio de extravasar a
violência da nossa vida cotidiana, do estupro que a cada dia somos submetidos
quando nossas liberdades individuais são violadas em nome da raison d'état; São
os jogos que educam, e coisas mais interessantes que o sistema educacional
ultrapassado.
Culpar os jogos é igual fazer o que nossos avós diziam sobre o cinema, que
incitava a violência, ou nossos pais que culpavam os desenhos por serem
violentíssimos, nada disso é tão verdade assim. Esse pensamento de puro
maniqueísmo não levará a nada a não ser uma hecatombe, um surto de aversão aos
jogos, e o papel que a imprensa teria de informar, seria só de gerar a
desinformação.
Sim, é desinformação partir para um estilo de jornalismo agressivo onde
tenta-se impor aspectos emocionais do ouvinte e pela falta de investigação dos
próprios fatos, a associação do jogo com o crime mostra que existe um total
desconhecimento dos veículos de imprensa com relação aos jogos. Afinal de
contas, pela teoria apresentada pelo Marcelo Resende, todo mundo que joga Banco
Imobiliário se tornará um milionário quando adulto. O Eike Batista deve ter
traumas da infância então.
As
crianças podem aprender com os jogos, podem aprender novas línguas dependendo
da linguagem do jogo, bem como dos processos cognitivos relacionados de
conhecimento tangencial, como muito bem Vigotsky apresentava em seus estudos,
as crianças podem aprender história (afinal eu sei até hoje o que significou a
Batalha de St. Lô e Chambois no esforço de guerra aliado a partir do Call of
Duty e a participação de soldados poloneses na guerra), matemática e geometria
(Angry Birds tá aí pra isso, aqui ali é física aplicada). Os jogos ensinam bem
mais do que podemos imaginar, mas não ensinam as crianças a serem assassinas,
não ensinam como as crianças a atirar armas, adultos ensinam.
O pai do garoto
ensinou o filho de 12 anos a atirar uma arma[1]. Isso sim é mostra de
responsabilidade, o que é mais perigoso, jogar um jogo ou ensinar o seu filho a
atirar com uma pistola? Não tenho motivos para julgar o pai em questão, ele
deve ter tido os seus motivos para ensinar o filho a utilizar-se de uma arma,
agora dizer que em razão dos jogos o menino foi levado a matar os pais é ser
bastante reducionista. Reducionismo até escolástico, porque no final das
contas, não explica nada praticamente, só é doutrinatório.
Os jogos
ensinam a matar as pessoas? Jogo numerosos jogos de guerra, mas não
teria mesmo a coragem de matar uma pessoa a sangue frio, existem fatores
conjugados que levaram a criança a cometer esse crime (se cometeu), desde falta
de atenção, dificuldade de aprendizado, isolamento até o velho e clássico
bullying na escola (parece que todo mundo esqueceu de Realengo).
Agora vem-se psicólogos
ou pseudo-psicólogos admitir que o menino talvez tivesse distúrbios mentais,
alienação e psicopatia. O problema dessas avaliações é que é muito fácil
julgar alguém de louco quando se está morto, mas fazer o trabalho de observar,
medicar e conversar é bem mais complicado e esse trabalho tais profissionais
não fizeram.[2]
A
história ainda está muito mal explicada, confere que se investigue mais antes
que se inicie as acusações, mas uma coisa é certa:
O convívio social, o
ensino e até mesmo o seio da família burguesa falharam com esse menino,
falharam por terem se direcionado demais e esquecido tudo o que poderia ser a
essência da vida. O menino não é culpado simplesmente por ter matado, o menino
é culpado por ter esquecido o que era a vida e o que representava o convívio
social, esse é o crime que a sociedade e a opinião pública o imputam. Mas
molesta-se também os direitos do indivíduo quando somos bombardeados com a
crescente impessoalidade da nossa própria sociedade e com o caráter cada mais
individual do nosso convívio humano, onde a figura do eu é destacada como o
ponto elevado dessa cadeia produtiva.
Assim fica a pergunta,
antes de culpar os jogos por terem cometido o crime (na verdade eles são
unicamente culpados de socializar as pessoas), qual foi a última vez que você
conversou com o seu filho?
[1]
O pai ensinou o filho a atirar com uma
arma: http://www.correiodoestado.com.br/noticias/pai-ensinou-garoto-suspeito-de-matar-familia-a-atirar-diz-po_190356/
[2] Acusações
de o menino ser psicopata: http://ultimosegundo.ig.com.br/brasil/sp/2013-08-08/alienacao-mental-e-patologia-social-podem-explicar-tragedia-familiar-em-sp.html
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