segunda-feira, 1 de julho de 2019

Haber e o uso da ciência para o "bem" e para o "mal"





A figura mais controversa pra mim na história da Ciência não é Oppenheimer (pai da bomba nuclear), nem Alfred Nobel (criador da dinamite) ou tampouco o nazista Werner von Braun (pai do V2 e do programa Apolo), pra mim a figura mais controversa é o Fritz Haber.


Fritz Haber ao mesmo tempo é um herói e um vilão, desde o século XVIII os europeus vivenciavam o dilema da escassez, as produções agrícolas estavam estacionadas enquanto houve um crescimento populacional exponencial, a América e a Rússia eram as fontes mais importantes para o abastecimento principal dos europeus, mesmo assim o continente europeu corria risco da fome em um curto espaço de tempo. Foi daí que surgiu o malthusianismo.

Nessa época era preciso usar o complemento do guano para inserir o nitrogênio nas lavouras e repor os nutrientes perdidos pelo uso extensivo das lavouras em modelo de monocultura no solo desgastado na Europa, o guano é produto de séculos de acúmulo dos dejetos das gaivotas sobre as montanhas áridas do deserto do Atacama, dessa forma a Guerra do Pacífico foi feita sobretudo por causa do guano. O Chile é ainda hoje o maior produtor de guano do mundo e naquela época era um produto caríssimo;

Fritz Haber, percebendo o problema de depender apenas de um produto cuja escassez era iminente, resolveu sintetizar o nitrogênio da atmosfera junto com o hidrogênio e dessa forma produziu amônia, o componente principal do ciclo do nitrogênio; Por conta do seu novo método, ele criou o fertilizante sintético. Haber salvou a humanidade da fome, ganhou um prêmio Nobel e virou herói.


Mas quando ele vira um vilão? Quando o mesmo Haber, a pessoa que salvou a humanidade, passa a usar a ciência para destruí-la, e foi o caso. Na Primeira Guerra Mundial, o Exército do Kaiser corria o risco de ser sufocado pelas frentes ocidental e oriental, isolado, o imperador montou uma comissão de cientistas para obter alternativas viáveis para o esforço de guerra. Haber apresentou uma: O gás.


Foi Haber que desenvolveu o gás clorídrico que foi usado nas trincheiras; Em protesto, Einstein desfez a sua amizade de longa data com Haber, a esposa de Haber se suicidou depois que soube que o marido tinha ganho uma promoção por ter desenvolvido o gás.

Haber nunca sentiu embaraço pelo que ele fez, nacionalista prussiano, Haber achava que ele tinha feito o que era certo, usar tudo ao seu dispor para garantir a vitória da Alemanha (que não aconteceu).
Eis que passa a guerra e Haber continua trabalhando com química inorgânica, tendo ideias muito boas, contudo infelizmente surge o nazismo. O problema que Haber era judeu e por conta disso foi expulso da Academia de Ciências prussiana; Haber dizia que ele era mais alemão do que os próprios alemães, mesmo assim isso não resolveu nada.


Haber é culpado pelo que viria acontecer depois. Ele continuava trabalhando com o estudo de gás para controle de pragas e a sua equipe estava desenvolvendo o Zykkon A e B quando Haber foi expulso da academia, o Zykkon B foi depois sintetizado e distribuído pela Bayer; Inicialmente usado para exterminar ratos ele acabaria sendo usado para outros propósitos, extermínio humano. O Zykkon B foi usado nas câmaras de gás.


O invento de Haber serviu para o Holocausto. A ironia foi que um judeu desenvolveu a arma que seria usada para matar 6 milhões de judeus durante a Segunda Guerra Mundial; Haber morreu muito antes disso acontecer, em 1934 desfrutando dos pacatos Alpes Suíços, Haber morreu rico  na Basileia, sendo conhecido pelo seu trabalho e pela controvérsia que até hoje cerca seu nome.

sábado, 29 de junho de 2019

República de Curitiba

Que moral tem o mouro

De ser baluarte da moralidade


Quando o único monumento


Que erigiu foi a criminalidade?





Que desatino bandido togado,


Num preâmbulo safado


Rasga a lei e se diz magistrado.


Martela sobre a mesa





A cegueira da balança.


A justiça tarada, desequilibra


A própria lei dos homens


E profana a justiça divina.





O martelo da justiça


É mais cego do que a faca


Que rasga a bandeira e


A barriga do fascista.





Moralidade desmoronada


Moro moralista mourisco


Prende molusco arisco





No tribunal de peroba


Da República de Curitiba,


A estrela vira estrela cadente.


Caem os mitos, surgem palmitos





Ontem era ídolo, agora é lixo.


Idolatria iconoclasta.


Que claustro!


Que maestria!





Mais que belo bandido


Que hoje está togado!





Conje conjugue,


Conje conjugue,


Que verbo não é lei,


Nem economista é matemático.





Ministro não sabe regra de três,


Ministro não sabe ler lei,


Ministra não sabe o que é azul,



Presidente não sabe o que é...


Presidência.





O pedaço de madeira


Adentra firmemente


Sob as costas dos olhos profundos.


Cortando por dentro o espírito


Nobre um povo.





Fechado nos gráficos,


Comendo pizzas de números,


Range pelas paredes,


O Paulo Guedes.





Cadê o TRILHÃO?


O trilho do trem da bitola


Corre sobre a vida tola


Do chicago bull americano.





Chicago bull ou chicago boy?


Boi bandido das ações,


Touro dos pobres,


Mimosa dos ricos.





Do alto de suas Mercedes,


Os bandidos de terno


Beijam as togas e lambem os coturnos,


E o agronegócio com agrotóxico.





Agro pop, pipoca todo mundo.


Mata índio, mata posseiro,


Mata com veneno,


O povo brasileiro.





Mas é isso banqueiro,


Deus Mercado é isso,


Dois pra cá, dois pra lá.


Conta-gotas do sangue do operário.



Vamos contar com o mercado.


Contar, 1, 2, 3...


3 mortos de fome por dia.





Um, dois, três.


3 negros mortos na favela.


Um, dois, três,


Três anos de crise.





“Nossa bandeira nunca será vermelha”


Não há nada mais escarlate do que pintar


De sangue o estandarte verde-amarelo


para fazer brilhar o cifrão dourado.

domingo, 26 de maio de 2019

Félicette, a primeira gatonauta


           Em 24 outubro de 1963, os pesquisadores aeroespaciais franceses lançaram uma gata de rua, Félicette, ao Espaço. Os russos já tinham lançado Laika no Sputnik II, em 1957 e os americanos tinham lançado dois chimpanzés ao cosmos, no mesmo período.



         Os franceses, no contexto de negação tanto aos americanos quanto aos soviéticos, resolveram desenvolver uma bomba atômica própria e um programa espacial próprio. O módulo subiu 210 quilômetros acima da Terra no foguete francês Véronique AG1, voando alto no deserto do Saara argelino. Félicette voltou quinze minutos depois, já condecorada como heroína de sua nação.
            Após seu pouso, cientistas franceses do Centro Educacional para Aviação e Pesquisa Médica (CERMA) estudaram as ondas cerebrais de Félicette para ver se elas tinham sido alteradas na sua viagem. Embora não se saiba muito sobre suas descobertas, ou sobre o destino final de Félicette, o CERMA disse que ela fez uma “contribuição valiosa para a pesquisa”.     

A tentativa dos franceses de entrarem na corrida espacial e a bomba H tem muita a ver com as desavenças de  De Gaulle com o Eisenhower (depois com o Kennedy) no início dos anos 60; Os franceses ainda achavam que eram uma grande potência e deveriam ser tratados como tal no plano diplomático mundial.
       O presidente De Gaulle era tão ousado que tirou a França da OTAN em plena Guerra Fria , refletindo os atritos que os franceses tinham com países anglófonos, primeiro a Inglaterra depois os Estados Unidos. Com a Guerra da Argélia e da Crise do Canal de Suez, as relações entre a França e os Estados Unidos pioram e os franceses acabam construindo conversações com o bloco soviético. O programa espacial francês inclusive pode ser relacionado à tentativa de fazer misseis para demonstrar aos americanos (e também aos soviéticos) o poderio tecnológico francês.

                                                 Vídeo sobre o voo de Félicette

        A Crise de Suez e a Guerra da Independência da Argélia mostraram que o orgulho francês permaneceu intacto mesmo após a humilhação dada pela Alemanha Nazista na Segunda Guerra, mas os soviéticos e americanos mostraram que a Europa não dava mais as cartas no mundo e aos poucos a França percebia que era uma idiossincrasia  manter um programa espacial dispendioso enquanto as colônias africanas se tornavam independentes.

          Félicette foi tratada como heroína pelo povo francês e foi lembrada como uma peça importante do orgulho nacional nos anos 60, mas o destino foi trágico e ela acabou esquecida. Logo após a viagem, a gatonauta já apresentava sequelas, ela acabou ficando cega e foi exposta a níveis de radiação fora do recomendado durante o voo orbital; Em virtude disso, ela sofreu uma eutanásia para que o seu cérebro fosse dissecado pelos cientistas aeroespaciais.





Sobre a diplomacia francesa no pós-Guerra, indico a série Au service de la France, disponível na Netflix, que mostra a Guerra Fria sob a perspectiva francesa.




A necrofagia do lucro


          Além dos bancos lucrarem ao acabar com a previdência social (aumentando a demanda por previdência privada), eles ainda querem lucrar sobre os aposentados pobres que não poderão aposentar nem pelo INSS.


          A ideia é fazer com que esses aposentados hipotequem suas casas e recebam um valor mensal do banco, no final, quando falecerem, o banco toma a propriedade dos idosos e joga no leilão.


          Os bancos literalmente viraram corvos, estão explorando os cadáveres de milhares de trabalhadores brasileiros para terem lucro sobre a pobreza na velhice; Os mesmos bancos que financiam a reforma da previdência, os mesmos bancos que cobram juros absurdos quando você entra no cheque especial, os mesmos bancos que devem bilhões ao governo em impostos e tributos da própria previdência social.


              São esses bancos, os "investidores", os representantes do "Deus mercado" que vão ficar com as suas posses na sua velhice. Admirável lucro novo, que novos tesouros nos trazes...







Não vai sobrar ninguém


Não vai sobrar ninguém


No Brasil,

Tiram a nossa paz na velhice,

tiram os nossos sonhos na juventude,

roubam nossos direitos quando adultos.



Nos dão veneno achando que é doce,

quando podemos comprar comida.

Cobram-nos ágios absurdos

para roubar as nossas posses.



Roubam a merenda de crianças,

poluem a nossa água,

nos extorquem novos impostos.



E onde está a sociedade?

Inerte.

Onde está a justiça?

Nos prende.

E a polícia?

Nos mata.



Não tem como sobrar alguém desse jeito,

é mais seguro viver em Marte

 do que tentar a sorte no Brasil.

A República do Shallow Now

          "A República do Shallow Now
         (e também do Golden Shower)



         Diante dos últimos períodos de conturbadas relações sociais, o país que outrora dizia ter acordado agora assiste bestializado a estupidez sendo impregnada em todos os aspectos da cultura, sociedade e política.



         Isso é uma das heranças da nossa cultura política messiânica que ao mesmo tempo que procura heróis, salvadores da pátria, cria a autofagia dos seus próprios ícones: Antes foi Getúlio Vargas, depois foi o Médici, Collor, depois o Lula, agora Jair Bolsonaro. Ao mesmo tempo que o brasileiro pratica a idolatria, ele é iconoclasta;



          Contudo, o ícone criado pela classe média brasileira é feito à sua imagem e semelhança, um indivíduo sem refinamento intelectual, que tem posicionamentos absurdos e não consegue ter a raciocínio minimamente lógico para a suas próprias ideias, como diria Sérgio Buarque de Holanda, o brasileiro é um ser cordial, não por cordialidade ser entendida como educação ou polidez, pelo contrário, cordial no sentido do original, em latim, de indivíduo movido pelo coração, não pelo raciocínio crítico.



             Foi exatamente isso que moveu as pessoas que saíram hoje na defesa de Jair Bolsonaro, não foi raciocinalidade de fazer a análise desse governo que se arrasta por quase um semestre e não faz nada de construtivo para a política brasileira, que não trouxe benefícios à educação, à saúde ou ao combate à corrupção, pelo contrário, só trouxe malefícios. Os que foram protestar hoje foram movidos pelas emoções, ao invés do coração, foram movidos pela bílis, pela raiva e hostilidade aos outros. Assim é o também o governo Bolsonaro, movido pela bílis.



          O brasileiro continua desnorteado do seu papel de protagonista no processo democrático, continua a enxergar apenas aspectos pontuais sob um prisma raso. E o que mais incomoda aos olhos vistos é que se dizem patriotas, mas louvam bandeiras estrangeiras.



          A frustração no futebol acaba se tornando frustração política e cria-se mágoas e ressentimentos que alimentam a retórica do ódio que vivenciamos hoje. Nisso vemos uma série de absurdos germinados na cultura da mediocridade:



         Eis que me lembro do Nelson Rodrigues e o seu conceito: "Complexo de Vira-lata", o brasileiro envergonhado da sua derrota no futebol na Copa de 1950 (tal como agora foi na Copa de 2014 e tbm na de 2018) toma para si a frustração e introjeta um complexo de inferioridade em relação às nações do dito "mundo desenvolvido".



         Temos ainda que lidar com o sofrimento de ver pessoas comuns criando hostilidade aos intelectuais, criando as mais absurdas pseudoteorias possíveis para explicar suas próprias narrativas de mundo e enquanto isso o país afunda a olhos vistos no atoleiro da corrupção.



          Hoje observamos do tupiniquim middle class que ele louva os americanos, mas não sabe falar uma frase decente em inglês. Vemos ministros de estado falsificarem sem qualquer tipo de embaraço diplomas universitários, vemos pessoas cultuarem (de novo o messianismo) um youtuber como se fosse filósofo, sendo que ele nem concluiu o primário;



          E como o brasileiro médio defende isso? Preso na sua bolha social, interagindo apenas com quem referenda as suas ideias, assistindo a TV aberta até o cérebro derreter, tomando como verdades fake news de Whatsapp, uma legião de idiotas acaba se tomando como um grupo de sábios e notáveis.



         Enquanto não se tem consciência do que está acontecendo, o brasileiro está imerso na sua própria mediocridade: a economia patina, o desemprego aumenta, a diplomacia brasileira tornou-se subalterna aos interesses americanos e a educação (como assim?) está se tornando arma de chantagem de meia dúzia de jagunços para aprovar a reforma da Previdência. E sim, Reforma da Previdência, quem fala que tem que reformar a previdência são pessoas que já estão aposentadas ou são pessoas estúpidas que não se importam que elas próprias serão afetadas com o corte direto nas suas próprias aposentadorias.



           É por isso quando entramos nesse terreno perigoso de culto à mediocridade, a política se tornou um ofício pornográfico, com escândalos, baixarias e absurdos incentivados pelo próprio governo, criando uma escatologia resumida pela expressão do próprio presidente: "O que é golden shower?"



             E nisso a necropolítica neoliberalista se alimenta do fervor ideológico dos olavistas para alimentar os interesses do mercado financeiro, dos rentistas, para a reprodução de seu capital especulativo em detrimento do trabalho árduo do brasileiro. Para desvirtuar o foco principal do brasileiro aos problemas econômicos o olavismo incentiva e alimenta o ódio às minorias e aos opositores políticos, e por extensão, o governo desse anteparo ideológico para incentivar a construção protofascista (ou já posso chamar de fascista) do governo Bolsonaro.



            E falam com nenhum embaraço que apoiam o presidente que vai cortar verbas na educação, que vai permitir que idosos não se aposentem e sejam a trabalhar até morrer e que aceitam de bom grado que o dólar dispare. Eles aceitam que a gasolina também chegue a níveis estratosféricos, que todos tenham porte de arma (inclusive milicianos) e que o desemprego aumente para alimentar a falsa sensação de "eliminar o perigo vermelho".



            Retórica pura e estúpida.

             Quem criou isso foi Olavo de Carvalho com sua escolástica messiânica e sem profundidade alguma, em um esforço de utilizar os autores clássicos, como Platão, Aristóteles, e também conservadores, Olavo de Carvalho (que antes era visto como piada) se tornou um guru de uma extrema-direita que não está disposta a ouvir outras narrativas que não sejam as suas.



            Juntos e Shallow now.

            Numa tradução tosca e descabida da música de Nasce uma estrela, Paula Fernandes traduziu tudo, a medíocre tentativa do brasileiro de classe média em se portar como "esclarecido e educado" com um provincianismo descarado ao cultuar de forma acrítica a cultura norte-americana; A sua total falta de percepção da realidade, sua falta de capacidade cognitiva para entender o mundo ao seu redor e a sua falta de profundidade intelectual até nos debates políticos (e conspiratórios) que ele alimenta.



            Juntos e Shallow now (rasos agora)"
                                                                                         Scriptor Inquietus

         

sábado, 25 de maio de 2019

Aço Incandescente III

        Por entre as verdes folhas dos ciprestes
       O uivo temeroso irrompia a falena.
       Ouça bem, o que digo, aedo
       Que bem vivo é tremor do medo
       Que ressabia sobre nossos olhos.

       A toque de fuzis, na intensa saraivada
       Jaz no chão gelado do solo russo
       O sangue de nossos camaradas.

       Seus olhos brilhantes estão opacos,
       as cores vistosas do sangue e do medo
       cortam a extensão desses campos.
       Corvo Negro está próximo."
                                                 Abraham Goldstein, 1918.

      Era uma noite de sábado quando Malinovsky foi acordado contra a sua própria vontade, desabou no chão contrariado enquanto Goldstein e Markus arrumavam suas trouxas de campanha, o céu estava impronunciável, sem nuvens, sem que pudessem haver adjetivos para quantificar aquela noite tão assombrosa, aos poucos começou a cair a chuva, roubando o calor dos soldados que se acomodavam junto aos trilhos do trem, a umidade fria fazia com que alguns tossissem. O chão de barro passou a corromper e enxovalhar as botas dos soldados, enquanto o comissário Petrov lia as ordens de Moscou através do telegrafo.

      Tomado por um completo desrespeito quanto a sua felicidade do destino, Malinovsky pensava se iria durar muito até que a guerra tirasse aquela noite cinzenta e torna-se tudo diferente... Não demorou.

      Os seus olhos viam de longe pequenos vultos correrem pela noite, quando de repente o fumo da pólvora resplandeceu sobre o ar, o comboio estava sendo atacado. Os tchecos chegaram mais cedo, as artilharia escondidas por trás das árvores começaram a quebrar o aço do trem blindado; o foguista, apressado, começou a dar marcha ré para salvar ao menos o trem, os homens tentaram correr para dentro da composição, não houve tempo. Os cossacos começaram a trotar com os seus sabres encurvados pelos flancos, enquanto os tchecos corriam das valas com rifles na mão, não havia nenhuma sombra de conforto naquela situação.

    Malinovsky se jogou no chão, Markus e Goldstein tentaram correr, mas foram contidos diante da fuzilaria. Com o rifle Mosin Nagant engatilhado, o jovem rapaz tentava ver no escuro algo que pudesse atirar; a noite estava tão escura que ele não entendia como os tchecos conseguiam enxergar, foi quando o comissário abriu um caixa com dinamites e começou a acender o pavio com o isqueiro. A toque de poucos minutos, explosões e clarões cortaram o campo aberto e estilhaçaram com o ataque dos tchecos.

     "AO ATAQUE!", gritou o comissário Petrov com um revólver Mauser nas mãos e uma espada na outra. Alguns homens corajosos seguiram atrás do comissário, Malinovsky foi um deles, com o rifle nas mãos ele disparava a esmo; as peças de artilharia se moviam e recalibravam seus canos, tinha que ser rápido, antes que os cossacos chegassem, os soviéticos tinham que rechaçar o ataque à ferrovia.

     Os cavaleiros eram doze ao todo, uma tropa irregular, de homens barbados com ushankas de feltro felpudo, Malinovsky se escondeu atrás de uma pedra e começou a atirar, acertou um cossaco à sua esquerda enquanto outro cossaco ressabiava o seu sabre sobre o pescoço de um companheiro. Diante do caos, Petrov se embrenhou na mata e entrou em luta corpo a corpo com um soldado tcheco escondido debaixo de um tronco de árvore. Aos poucos, os oitenta soldados que sobraram, seguiram o exemplo dos dois e tomaram a iniciativa no ataque noturno; A lua vez por outra aparecia e iluminava a floresta, naquela fronteira entre a Europa e a Ásia, podia-se ouvir os lobos uivando à distância; Não demoraria muito para eles farejarem o cheiro de sangue.

       Markus correu raivosamente na direção de dois Brancos que disparavam indiscriminadamente nos camaradas feridos junto à linha do trem, enquanto os soldados agonizam de dor, os dois patifes se esforçavam pra prolongar a dor, atirando em suas pernas; Malinovsky ao perceber que Markus iria ser atacado por um tcheco, pulou em cima de um cavalo dos cossacos e atropelou o tcheco sem cerimônia.

       Goldstein tremia de medo quando de repente um bala de canhão caiu no jovem rapaz que estava se escondendo ao seu lado, com as tripas expostas, o garoto produzia um grunhido tão horrendo que ensurdeceu a todos no campo de batalha, foi quando o pequeno Abraham pegou o seu rifle e correu em direção à floresta com a baioneta descoberta.

       "Camaradas, protejam-se, não deixem que os canalhas os peguem desprevenidos", gritava Petrov.


        O comissário tropeçou numa pedra e caiu no chão acidentado de um morro, enquanto se arrastava pelo relevo irregular, ele servia de alvo fácil para os tchecos que correram em sua direção.

       "Cuidado, comissário!"

       Foi quando Markus entrou na frente e levou duas balas nas costas, não teve muito tempo, Petrov só pode ver o rosto do jovem letão cair pesadamente na sua frente, seus olhos exprimiam dor, aquilo chocou o comissário, que ainda impactado pela cena, correu para pegar o rifle e disparar contra os emboscadores. A escaramuça produzia resultados miseráveis, mas finalmente o trem blindado contornou a floresta e achou uma posição confortável de tiro, pela retaguarda dos Brancos, as canhoneiras estouravam os tímpanos e quebravam a defesa dos Brancos. As peças de artilharia explodiam ao impacto das cargas de fogo  e o aço incandescia com o calor, queimando a carne dos artilheiros inimigos. O cheiro da carne e do sangue tomou o campo de batalha, os tchecos perceberam que estavam em menor número e começaram a fugir, os cossacos tinham sido liquidados em pleno campo de batalha, Corvo Negro, o comandante Branco gritava para os seus homens voltarem, mas era ignorado, mais do que nunca, aquela tinha sido uma mostra da coragem dos bolcheviques contra os Brancos.

        Neste ataque durante a madrugada cinzenta, diante da cortina de fumaça, Petrov viu entornar o caldo vermelho da Revolução, em plena ebulição o vento frio cortava os seus ossos e beijava as têmporas de seus homens, Petrov tinha perdido ao todo vinte e cinco homens, os Brancos quarenta e três, havia o perigo de ter mais ataques durante a madrugada, foi quando ele gritou:

     "Vamos voltar para o trem, está muito arriscado para ficarmos ao descoberto; Amanhã chegamos a Noviy derevno".


       E assim foi o dia 27 de junho de 1918.



terça-feira, 21 de maio de 2019

Aço incandescente II

         Esperanças e medos


         "Todas as vezes que penso na grandeza desses dias, penso em Maiakovsky:
                'Camaradas, somos um rochedo de granito,
                 Os bandidos da Entente arremessam-se contra ele
                 Mas nada abaterá a Rússia Soviética
                 À esquerda, à esquerda, à esquerda!"   (Nikolai Petrov)


        Dia 25 de julho de 1918

        Desde a tomada triunfal de Petrogrado e Moscou no final do ano passado as coisas ficaram cada dia mais complicada, a Revolução teve que encarar logo cedo a sanha do imperialismo e os nossos inimigos espoliaram de nosso jovem país a Ucrânia, a Bielorrússia e os países bálticos. Na Ucrânia, o populismo ameaça o sucesso da revolução no campo e aos poucos os bandidos de Krasnov e Kolchak se dirigem à nossa capital, Moscou.
         Bukharin sugeriu a evacuação de Petrogrado que corria risco de ser tomada por Yudenich e Wrangel, os alemães que tomaram Pskov e Minsk das mãos de Trotsky agora brigam contra os cossacos ucranianos; Krasnov avança sobre o Don e infelizmente estamos no seu encalço, vivemos em função dos trilhos: Comemos sobre os trilhos, dormimos sobre os trilhos, bebemos sobre os trilhos, atiramos sobre os trilhos e morremos sobre os trilhos, a locomotiva é a nossa única proteção em território hostil, os camponeses não confiam em nós e quando falo que sou comissário, alguns correm com os seus ancinhos em minha direção.

        Percorremos toda a região do Volga, corremos por Kazan, Simbirsk, Oremburgo e agora caímos na Sibéria, no meio desse impasse; Temos que impedir que os tchecos de Kolchak se juntem aos cossacos de Krasnov, a tarefa é difícil e tememos insurreições dos kulaks de Iaroslav. Encontrei- me ontem com três rapazes vindos de Petrogrado, faz tanto tempo que não tenho notícias do oeste que senti-me renovado ao encontrar esses rapazes no vagão do trem em direção à Sibéria. Um deles era mais ativo, um letão chamado Markus, com olhos meio porcinos e rechonchudo, o outro era um judeu pequeno e misterioso, chamado Goldstein e o terceiro era um jovem rapaz chamado Malinovsky, os três recém alistados e estavam em primeira missão contra Kolchak.

        Malinovsky me confessou que o verdadeiro motivo para ter se alistado foi a fome em Petrogrado, a situação anda tão alarmante que as rações de pão foram reduzidas para 200 gramas por dia; Boris Smirnov e eu nos reunimos no vagão principal para planejar a estratégia do cerco às forças de Krasnov, esses dias andam tão corridos, que fumo um cigarro atrás do outro. Um telegrama de Moscou chegou logo a tarde com más notícias, Trotsky mandava um memorando falando que nossas forças são equivalentes à metade das forças de Krasnov e nossos reforços não chegarão a tempo para enfrentar Kolchak. A Revolução corre perigo e como comissário tenho um papel importante a desempenhar, mesmo que isso resulte no fim da minha própria vida.

       Vladimir Ilyich me confiou essa missão e tenho a obrigação de retribuir o voto de confiança, assim como enfrentamos a cavalaria de Krasnov no passado, agora correremos com o último homem que tivermos disponível contra os sabres encurvados dos cossacos. A guerra é uma barbaridade para quem tem consciência que todos nós somos irmãos de sangue, mas se for o preço para a nossa própria liberdade, é um valor muito pequeno a se pagar; Juntos nós seguimos cada mais em direção à revolução mundial.

                                                           Nikolai Petrov, comissário do 2° Corpo do Exército Vermelho".


       Petrov saiu de  sua cabine na parte da frente do trem e seguiu em direção ao samovar, próximo aos assentos dos soldados, era da sua natureza ignorar a hierarquia, desde o tempo em que fora marinheiro do Encouraçado Potemkin, e hoje não seria diferente: serviu duas xícaras de chá de amoras e entregou para o grupo de Petrogrado. Markus e Malinovsky agradeceram, Petrov voltou ao samovar e serviu um pouco de chá para si e para Goldstein.

       "Camaradas, devemos estar chegando a Belyi derevno ao amanhecer, recomendo que vocês aproveitem ao máximo a noite de hoje para descansar.", disse Petrov.

       "Finalmente! Eu não aguento mais sacolejar nesse trem, mais um pouco e eu começo a vomitar de novo", disse Goldstein.

       "Você terá muitos motivos para vomitar amanhã, camarada Goldstein, quando você ver um dos seus companheiros ter as tripas arrancadas pela baioneta, a primeira reação vai ser querer vomitar. Se engana se você acha que o seu impulso vai ser pegar no rifle e atirar, a guerra é bem mais inconsciente do que isso".

         " A quanto tempo está na linha de frente, Nikolai Ivanovich?", perguntou Malinovsky.

        "Desde Moscou, Bukharin e eu lideramos a tomada do Kremlin dos cadetes. Quase perdemos, muitos homens bons, muitos bons soldados morreram durante aquela semana. Depois eu fui enviado para a Ucrânia e depois para o Don, Trotsky gosta de usar o Segundo Exército para tapar os buracos que ele cria", respondeu Petrov.

        "Você conhece o camarada Trotsky? Como ele é?", disse o jovem Markus com evidente curiosidade.

         "Se de longe ele parece inacreditável, de perto ele é realmente inacreditável, no mal sentido. Trotsky é um poço de arrogância, camarada, quando o conhecerem verão que eu falo a verdade."

        O semblante severo de Petrov escolhia em seus olhos o enigma de sua própria tristeza, a guerra estava tomando o seu preço, Svetlana, sua esposa, tinha mandado uma carta falando que Olga pegou uma coqueluche e o médico não podia dar maiores esperanças, o jovem comissário comunista não acreditava em milagres e tomado por um pessimismo genuíno se preparava para o pior, sentia-se perdido,  mas apegado ao seu próprio relógio, ele meditava rapidamente sobre o tempo. Será que ainda haveria tempo dele chegar a Moscou depois de derrotar Krasnov? Ou será que ele está destinado a ser refém do seu próprio relógio, ele não sabia.

        O comissário se levantou e seguiu para a sua cabine, os três amigos se entreolharam e disseram:

        "Realmente o comissário é uma pessoa estranha, Abraham Efremovich.", observou Markus.

        "Espero que ele saiba o que está fazendo, os Brancos não estão para brincadeira"

        "Muito menos nós"...



                                           Parte 3 será publicada na quinta feira.

domingo, 19 de maio de 2019

Aço incandescente I

     Mas,
     Dizei-me,
     anêmicos e anões,
     os grandes,
     onde?
     Em que ocasião,
     escolheram
     uma estrada
     batida?


                                         Nesta vida
                                         Morrer não é difícil.
                                         O difícil
                                         é a vida e seu ofício.

                                                                                  Vladimir Maiakovsky




      "Estamos famintos de liberdade, e com nossa inclinação natural para a anarquia, podemos muito bem devorar a nossa liberdade. É uma coisa bastante provável. Nós destruímos as velhas formas de vida apenas fisicamente; moralmente elas nos cercam e estão em nós mesmos". O texto escrito em letras garrafais era distribuído aos montes, passando de mãos em mãos pelas vielas do bairro operário. O recado de Maximo Gorky era lido atentamente por oradores que usavam pequenos caixotes como se fossem palcos, a cidade estava em efervescência, apesar do frio daquela manhã cinzenta.


       Logo após a Revolução de Fevereiro, os bolcheviques e anarquistas foram os primeiros a serem intransigentes no combate à guerra. Todos estavam cansados da guerra, os soldados, as mulheres, as crianças. Os operários, os camponeses. O pão aumentava o preço todo dia, o carvão era racionado em migalhas no meio do inverno, os trabalhadores faziam armas e munições, mas ainda assim, mesmo trabalhando por 15 horas a fio, ainda era insuficiente para as tropas que lutavam contra os alemães. Foram quase três anos assim até que em outubro tudo estourou.


       O Instituto Smolny incendiou para sempre as páginas da história, Antonov Oevesenko corria com chapéu e rifle na mão na frente dos soldados para tomar o Palácio de Inverno. Lenin discursava, o encouraçado Aurora já tinha disparado aquela bala que iria sepultar de uma vez por todas a fraca república menchevique. Quantos sonhos surgiram naqueles dias! Konstantin Sergueiovich saiu da fábrica Putilov em Virborg e correu com seus camaradas gritando a Internacional a plenos pulmões, o passado era por fim enterrado, algo novo iria nascer. Algo belo, nada mais de patrões! Nada mais de senhores! Cada um agora seria chamado de camarada e cada um seria igual ao outro. Quantos anos ele esperava para ser ouvido, quantos anos ele não baixou a cabeça inconformado com medo do chicote da Okrana? Não mais.

        Foi quando ele soube que a guerra continuava. O czarismo não se dava por vencido e o Exército Branco ameaçava o futuro da revolução, foi por isso que ele se inscreveu para o curso de artilharia na escola Konstantinovskoe, ele pegou o bonde no centro e seguiu para a avenida Zabalkansky,17. 

       "Nome, Patronímico e sobrenome", questionou o chekista responsável.
       "Konstantin Sergueiovich Malinovsky"
       "Ocupação?"
       "Torneiro mecânico"
       "Camarada Malinovsky, sabe manejar uma arma?"
       "Sim, eu trabalhava na fábrica (de armas) Putilov.
       "Muito bem, precisamos de mãos firmes para esmagar os inimigos da revolução. Peso, altura e idade"
        "65 kilos, um metro e setenta e cinco, 24 anos".
        "Sabe o mínimo de aritmética?  Pra função que você irá desempenhar é preciso ler e escrever sem dificuldade, falar fluentemente e saber calcular".

          "Sim, camarada, eu sei calcular e ler sem problemas"

          "Míope?"
        
          "Não."

         "Muito bem, entre naquela fila".

          Malinovsky entrou numa fila que se formava na lateral do edifício, havia apenas dez pessoas na sua frente, cada uma delas era conduzida para dentro das instalações onde eram obrigadas a se despir e eram analisadas por um médico, quem estivesse com suspeita de tifo era descartado imediatamente. Logo após ter sido examinado, Malinovsky recebeu um pedaço de pão e de sopa, sentou-se no canto do refeitório.

          "Camarada, esse local está ocupado?"

          "Não, pode-se sentar", ergueu a mão por educação.

           Dois homens se aproximaram e sentaram-se defronte ao jovem rapaz. Um era pesado, com rosto ligeiramente rechonchudo, braços curtos e olhos brilhantes, tinha um sotaque ligeiramente carregado, Malinovsky apostou que fosse letão. O outro era pequeno, esguio, mas aparentava estar bem doente, o nariz adunco denunciava que era judeu.

            "Vimos o anúncio no Pravda", abriu a conversa o letão, "Parece que vamos ser mandados para ofensiva contra Kolchak"
   
             "Tomara, não aguardo a hora para acabar com esses Brancos", falou Malinovsky.

            "Eu sendo sincero só quero voltar vivo para conseguir casar com Irina, minha noiva", falou o pequeno homem com aparente vergonha, mastigava o pão com dificuldade e mantinha a cabeça baixa a todo momento.

             "De onde você é, camarada?"

            "Odessa. Eu estava na cadeia, me soltaram a pouco tempo"

            "Difícil,  a Ucrânia está toda com os Brancos, isso quando o problema não é Makhno, só Kiev é nossa", respondeu Konstantin Sergueivich.

            "É, a agulha é fina, mas o rasgo é grande", disse o letão em tom de pilhéria. "Eu sou Janis Markus, esse é Abraham Goldstein", os dois estenderam os braços.

              "Konstantin Malinovsky".

              "Prazer, camarada"


             Logo depois do almoço, os recrutas foram encaminhados ao dormitório para deixarem as suas coisas e voltaram ao salão principal onde estava armado um palanque. Um homem pequeno, de barba aparada, nariz aduco e cabelos encaracolados tomava a frente, ele vestia um casacão de couro preto, calças de brim escuro e botas. Aquele era Trotsky, o Comissário da Guerra:


           "Camaradas, cada um de vocês foi selecionado para representar o nosso esforço de derrotar os resquícios cadavéricos do czarismo. O mundo inteiro está de olho em nós, as potências imperialistas nos ameaçam, mas nós somos um vergalhão de aço que não pode ser dobrado diante as adversidades. Cada um de nós tem a missão de defender os ideais de nossa revolução proletária. Os nossos filhos, nossas mulheres e nossos camaradas contam com isso, devemos estar fortes e ágeis, a hidra da autocracia ainda não foi eliminada! Mas serão vocês, camaradas, que irão cortar de uma vez por todas esse câncer que explorou por tantos séculos nossos antepassados.

           Guerra aos canalhas czaristas! Paz para os nossos filhos e para nossas esposas! Todo poder aos Sovietes! Trabalhadores do mundo, uni-vos!"


          E foi quando a banda marcial começou a tocar a Internacional, aquela massa disforme de 30 homens, cantou desafinadamente o hino em uníssono, Trotsky desceu do palanque e deu um breve aceno aos homens, logo em seguida, as aulas começaram. Seria um curso preparatório de dois meses até que todos pudessem ser declarados aptos para o front da Sibéria.


         E foi assim que se passou, dois meses, todos estavam sendo embarcados de trem em direção a Omsk, para combater a Legião Tcheca e os Exércitos de Kolchak.

          Durante o regime czarista, exigia-se que os soldados andassem enrijecidos, de barrigas encolhidas, sem respirar, executassem manobras militares circenses sobre comandos de eia, hurra, e cantassem os hinos em homenagem ao czar. O regime precisava disso para se manter sólido, mas agora tudo isso era passado, os marinheiros de Kronsdant, no lugar, marchavam com bandeiras negras e vermelhas, gritando a plenos pulmões a Marselhesa dos Trabalhadores enquanto se despediam dos camaradas que iam para a Sibéria.

         "Somos o exército do trabalho combativo! Ninguém irá nos comandar, companheiros!" Gritava o comissário Chernov enquanto todos embarcavam. "Saudações a vocês, companheiros do regimento Moskovsky, granadeiros, trabalhadores e metralhadores. Vocês acabarão com a raça de Kolchak!"

          "Konstantin, leia isso que Abraham escreveu", Markus entregou-lhe o papel


           "Guardas! Gendarmes!
            Escutem, fúteis.
            Será que fomos nós que levamos
            Essa escória aos quartéis?


            Ou foram vocês que colocaram
            às suas próprias fileiras.
            Bando de covardes,
            múmias desse passado remoto
            que iremos hoje apagar para sempre.

            Seremos só culpados
            De apunhalar de peito aberto
            A asquerosa nódoa dos seus pecados
            contra o grande esforço do proletariado!

            Morte aos canalhas imperialistas!
            Morte a vocês, corvos negros da morte!"


            "Ficou muito bem feito, Abraham", Konstantin Sergueivich olhou para o amigo, "Mas sua atenção é ao fuzil e não à pena. Essa guerra vai ser vencida só na base da baioneta".

              "Ainda assim venceremos".


         A pesada locomotiva começou a mover suas bobinas à medida que o vapor quente se soltava e condensava no topo de sua chaminé, aos poucos o cavalo de ferro arrastava os quatro vagões da estação Yaroslav em direção à Sibéria. Era com pouca cerimônia que os três companheiros se separavam da jovem capital soviética e de sua efervescência e iam em direção ao desconhecido terreno da guerra; Malinovsky tirou uma garrafa de vodka debaixo do casaco e dividiu com os dois amigos:

           "Brindemos!"

           "Ao desconhecido!"


           "Ao desconhecido!"







                Continua na terça-feira


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