sábado, 23 de abril de 2016

Trem Noturno para Lisboa (filme)



         Nesses tempos difíceis, tenho passado muito tempo dentro de casa, sobretudo assistindo filmes e lendo notícias. Dei um tempo da literatura por tempo indeterminado e sobretudo da escrita, mas não foi algo proposital.

         Nesses últimos dias acompanhei com aflição os lançamentos da Netflix e encontrei esse filme. Elegante, singelo e metafísico. Ando com preconceito com o cinema contemporâneo mas a ideia me convenceu do contrário. Trem Noturno para Lisboa é um filme que fala sobre o passado, o legado no presente e nos convence de que a vida tem questões intermináveis através dos anos.

        Como toda adaptação de livro, o filme, baseado no romance de Pascal Mercier, possui uma introdução impactante:

        Raymond  Gregorius é um professor do segundo grau em Berna, na Suíça. Separado, vive uma vida solitária e melancólica até que tem a sua vida revirada quando encontra uma jovem que ameaça se jogar de uma ponte. O choque que Gregorius tem no momento em que vê a moça tentando o  suícidio faz ele largar seus papéis e se meter numa aventura sobre o seu próprio conhecimento. Após salvá-la, ele acaba acidentalmente ficando com o seu casaco e procura entregá-lo, até que encontra um livro de um poeta português perseguido pelo regime salazarista.

        Indelicado, mas curioso, Gregorius acaba lendo o livro e se simpatizando com o autor, até que decide de súbito entrar numa viagem para Lisboa para conhecer o mundo de Amadeu, seu passado no liceu católico, sua relação familiar, sua profissão como médico e sua militância contra o regime salazarista que colocam em cheque sua própria vida pessoal.



        Nisso, Gregorius conhece os antigos companheiros de causa de Amadeu, a irmã e reconhece na sua procura pela verdade um pouco de autoconhecimento próprio. O livro através de sua história traz reflexões ao próprio leitor, que obstinado tenta compreender o desassossego daquele jovem poeta com aquele mundo de totalitarismo e injustiça.

       Quando vi esse filme, senti-me bastante angustiado com a trajetória desses dois personagens e do seu deslocamento temporal  e geográfico. Os dois marcados pelo sofrimento estão a procura de alguma forma de redenção mediante a busca da justiça. Existe um elemento de Benjamin, Baudelaire e sobretudo de Albert Camus, no Estrangeiro que torna a trama ainda mais especial e nos faz compreender que mesmo na dureza dos regimes mais funestos, ainda há margem para as inquietações cotidianas que todos enfrentamos em nossas vidas.

       Desmistificado, devemos ser críticos, mas elegantes. Um filme desses não é alvo de grande bilheteria, mas merece o mérito de ser visto com os olhos sensíveis aos sentimentos e inquietações de nosso mundo moderno. Foi esse filme que me destravou desse lapso criativo e espero que tenham uma impressão positiva, semelhante a que tive com essa película.

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