quinta-feira, 4 de outubro de 2012

Relíquias

     Desenterrar monstros do passado é uma das maiores atividades que um ser humano pode querer fazer, talvez uma das poucas.

      A verdade é que querendo ou não desenterrar coisas deve ser trabalho de um arqueólogo  por mais que seja tolo dizer isso, parece o mais adequado, pois cada fato é como um artefato na estrada da vida, e todo esse artefato deve ser descoberto com calma e simplicidade, sem movimentos brutos e espasmos, com as mãos delicadas e decididas, com luvas para não se sujar com a podridão do tempo.

        Antes que tome um chicote e um chapéu fedora e vá explorar os sete mundos com essa singela ideia, entenda que as relíquias nem sempre são das melhores, nem mesmo os seus vestígios são os mais belos e sempre poderá haver uma pedra absurdamente grande que irá correr atrás de você, ou mesmo o caminho pode desabar.

        Acho que aconteceu isso comigo, em meio a um esforço filosófico posso ter me excedido demais, mas como bom explorador, não volto para trás, estou atrás de minhas próprias relíquias e todas as grandes amizades, e as pequenas também, são jóias do passado que deixei perder no meio de minha caçada.

        É verdade, ainda odeio aquilo que sempre digo e não me importo com outros, minha única busca são as relíquias de um passado já bastante esquecido, que ótimo não?

        Não há nada mais feliz do que se isolar do mundo por completo, fechar suas velhas amizades sem futuro e no meio da noite desenterrar uma preciosa relíquia esquecida, empoeirada e largada em algum canto. Sopro com força a poeira sobre sua armadura de metal, e abro de forma delicada a portinhola do aparelho, a velha máquina de datilografar ainda funciona.
       
         Pois é, não faz sentido, não faz sentido querer se debruçar em mecanismo tão singelo e duro como é uma máquina de escrever, no qual você não tem autocorretor, nem mesmo como apagar as suas besteiras no próprio papel.

          Não há nada mais agradável do que sentir nas narinas o odor ocre e até um pouco agressivo da tinta que o faz ficar cada vez mais relaxado e compenetrado no seu trabalho, agora sim entendo como era bom escrever à antiga, sem twitter, Msn ou mesmo Facebook da vida. Você não precisa se autoafirmar, não precisa conversar com as pessoas, simplesmente trabalha só para si mesmo.

           É claro que não tem mais graça sem algumas conversas, mas essa velha relíquia é bem mais prazerosa do que ficar em contato com modernidades estranhas e desprovidas de valor simbólico, prefiro agora essa pequena criatura que se chama máquina de escrever.

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